#CADÊ MEU CHINELO?

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segunda-feira, 29 de março de 2021

[over12] BRASIL ENCALHA NO CANAL DE SUEZ

:: txt :: Copyleft ::



Navio encalha no Canal de Suez, administrado pelo governo Bozo
 
Bolsonaro: "Eu pescava muito em Angra. Conheço tudo de barco. Esses barcos encalham mesmo. Fazer o que? Lamento. Nós temos rodovias. O que não pode é ficar tudo parado por causa de um barco. Não dá para ir de barco, vai a pé".
 
Paulo Guedes: "O problema é que no Governo PT eles deixaram assorear muito o canal. São 30 anos de detritos. Nós lançamos uma reforma para triplicar o canal e tirar 20 trilhões de toneladas de lama. Mas, infelizmente, o Congresso não nos deixa trabalhar".
 
Ernesto Araújo: "Isso é resultado do globalismo comunista mundial que quer mandar mercadorias para o mudo inteiro. Os outros países precisam entender que o Brasil mudou. Que somos patriotas e o povo quer o canal assim".
 
General Heleno: "Não tem problema nenhum com o canal. O Presidente agiu certo em não fazer nada. O Exército é uma instituição respeitável e qualquer ameaça de intervenção será vista com ressalvas".
 
André Mendonça: "Nós estamos tomando providências cabíveis para o devido enquadramento legal, com base na lei de segurança nacional, de todos que falarem que o problema no canal é assunto do presidente".
 
Tarcísio: "Para desencalhar o navio de forma rápida precisamos de uma equipe multidisciplinar, esforços logísticos e de engenharia que demandam investimento maciço e emergencial. Mas a proposta do Governo de não fazer nada é boa também".
 
Marcos Pontes: "Eu posso garantir que o canal de Suez existe, pois o vi com meus próprios olhos quando orbitei a terra".
 
Salles: "Tem que aproveitar agora que tá todo mundo olhando para coisa do canal e passar a boiada na flexibilização das leis ambientais. Essa coisa de navio encalhado é culpa desse monte de regra ambiental que não deixa o navio fluir".
 
Rodrigo Maia (em nota): "Repudio veementemente o encalhamento do navio do canal de Suez. O Brasil não pode mais conviver com isso".
 
Arthur Lira: "Temos um grupo de empresário interessados em cuidar dos assuntos do canal. Será bom para o Brasil e para o empresariado".
 
Fux: "Ante o exposto, concedo a medida em tutela liminar, para determinar a imediata remoção do navio, se possível e, se não, que seja apresentado um plano de remoção em até 3 meses".
 
General Mourão: "Olha, essa coisa no navio ai, eu não vi direito, a imprensa fala muito. De meu lado, eu digo que eu retiraria o navio. Mas isso é o que eu acho. É minha opinião. Mas o Presidente é o Bolsonaro. Então..."
 
Damares: "Essa doutrinação ideológica é que faz isso. Veja se é possível. Mostrar na TV, crianças vendo. Um navio entrando num canal! O que as pessoas vão pensar?"
 
Pazuello: “O canal vai ser liberado no dia D, na hora H.”

quinta-feira, 23 de junho de 2011

[cc] COPY ME E REMIX ME

TORRES, Aracele Lima. Copy me e Remix me: o movimento de contestação do copyright no contexto da cibercultura

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

[copyleft] OS ESCRAVOS DO SÉCULOS XXI



::txt::Luther Blisset::

Os escravos do século XXI não precisam ser caçados, transportados e leiloados através de complexas e problemáticas redes comerciais de corpos humanos. Existe um monte deles formando filas e implorando por uma oportunidade de trocar suas vidas por um salário de miséria. O "desenvolvimento" capitalista alcançou um tal nível de sofisticação e crueldade que a maioria das pessoas no mundo tem de competir para serem exploradas, prostituídas ou escravizadas.

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

COPYRIGHT, COPYLEFT E AS CREATIVE ANTI-COMMONS

::txt::Anna Nimus::

A Propriedade Intelectual enquanto Fraude

Se como Proudhon afirmou na sua célebre frase, a propriedade é um roubo, então a propriedade intelectual é uma fraude. A propriedade é um roubo porque o detentor da propriedade não tem qualquer direito legítimo ao fruto do trabalho. Os proprietários não conseguiam extrair mais do que os custos de reprodução dos instrumentos que eles contribuíam para o processo senão através da obstrução do acesso por parte dos trabalhadores aos meios de produção. Nas palavras de Benjamin Tucker, o credor tem direito à devolução do montante integral e nada mais. Quando os camponeses da era pré-industrial se viram impedidos pelas novas vedações de acederem à terra comum, pode-se dizer que a sua terra lhes foi roubada. Mas se a propriedade física pode ser roubada, será que a inteligência ou as ideias podem ser roubadas? Se a vossa terra vos é roubada, deixam de a poder usar, excepto segundo as condições impostas pelo novo “proprietário” privado. Se a posse de uma ideia é análoga à posse de propriedade material, ela deveria ser sujeita às mesmas condições de troca económica, confisco e apreensão - e em caso de ser apreendida deixaria então de ser a propriedade do seu dono. Mas se a vossa ideia é utilizada por outros, vocês não perdem a capacidade de utilizá-la - então, o que é que foi de facto roubado? A noção tradicional de propriedade, como algo que pode ser detido em exclusividade, é irreconciliável com intangíveis como as ideias. Ao contrário de um objecto material, que apenas pode existir num lugar a cada momento, as ideias não são rivais nem exclusivas. Um poema não deixa de pertencer menos ao autor por existir em milhares de memórias.

Propriedade intelectual é um conceito desprovido de sentido - as ideias não funcionam como a terra e não podem ser detidas ou alienadas. Todos os debates sobre a propriedade intelectual travados nos tribunais e entre os panfletários ao longo do século XVIII evidenciaram esta contradição. O que estes debates tornaram óbvio é que os direitos à posse de ideias teriam quer ser qualitativamente diferentes dos direitos à posse de propriedade material, e que a facilidade de reproduzir ideias colocava graves problemas à imposição desses direitos. Em simultâneo com os debates filosóficos acerca da natureza da propriedade intelectual, começou a surgir um discurso descomunal que criminalizava a pirataria e o plágio. A tirada mais famosa contra a pirataria foram os opúsculos publicados por Samuel Richardson em 1753 onde denunciava as reimpressões irlandesas não autorizadas da sua novela Sir Charles Grandinson. Contrastando a esclarecida indústria livreira britânica com a selvajaria e a imoralidade da pirataria irlandesa, Richardson criminaliza as reimpressões como se se tratassem de roubos. Na verdade, as suas afirmações não tinham qualquer base legal uma vez que a Irlanda não estava sujeita ao regime de propriedade intelectual da Inglaterra. E o que ele denunciava como sendo pirataria, os editores irlandesas encaravam como uma retaliação justa contra o monopólio da Stationers Company. Um ano antes dos opúsculos de Richardson, tinham ocorrido motins nas ruas de Dublin contra as políticas fiscais britânicas, que se inseriam numa luta política mais vasta da independência irlandesa face à Grã-Bretanha. Ao afirmar que esta Causa era a Causa da Literatura em geral, Richardson concebeu a batalha pela propriedade literária em termos puramente estéticos, isolando-a do seu contexto político e económico. Mas o seu recurso à metáfora da pirataria reavivava a história colonial da Grã-Bretanha e a sua repressão brutal dos piratas do mar. A própria pirataria marítima do século XVIII tem sido interpretada como uma forma de guerra de guerrilha contra o imperialismo britânico, tendo também criado modelos alternativos de trabalho, propriedade e relações sociais baseadas no espírito da democracia, partilha e assistência mútua.

A descrição que Richardson dava da originalidade e da propriedade excluia qualquer noção de apropriação e transmissão cultural. Nunca antes tinha um trabalho pertencido mais a um homem do que este é dele, argumentava, retratando a sua novela como se fosse Nova em todos os sentidos da palavra. A sua afirmação era particularmente irónica, dado que ele próprio se tinha apropriado, tanto na novela como nos opúsculos, das histórias de pirataria e plágio provenientes da literatura popular do seu tempo, bem como de O Etíope de Heliodoro, um romance do século III d.c. que foi amplamente imitado ao longo do século XVIII. A ideia de originalidade e o individualismo possessivo que engendrou criaram uma vaga gigantesca de paranóia entre os “génios” autores, cujo receio de serem roubados parecia disfarçar um medo mais básico de que a sua pretensão à originalidade não passasse de uma ficção.

A criação artística não surge ex nihilo (a partir do nada) dos cérebros de indivíduos como se fosse uma linguagem privada; ela foi sempre uma prática social. As ideias não são originais, elas baseiam-se em estratos de conhecimento acumulados ao longo da história. A partir destes estratos comuns, os artistas criam obras que possuem especificidades e inovações inequívocas. Todas as obras criativas combinam ideias, palavras e imagens provenientes da história e do seu contexto contemporâneo. Antes do século XVIII, os poetas citavam os seus predecessores e fontes de inspiração sem reconhecimento formal e os dramaturgos apropriavam-se à vontade dos enredos e diálogos de fontes anteriores sem atribuição. Homero baseou a Ilíada e a Odisseia em tradições orais que remontavam a séculos atrás. A Eneida de Virgílio inspira-se fortemente em Homero. Shakespeare tomou de empréstimo muitos dos seus enredos e diálogos narrativos de Holinshed. Isto não quer dizer que a ideia de plágio não existia antes do século XVIII, mas que a sua definição alterou-se radicalmente. O termo plagiador (literalmente, raptor) foi pela primeira vez usado por Marcial no primeiro século d.c. para descrever alguém que raptava os seus poemas ao copiá-los por inteiro e fazia-os circular com o nome do copista. O plágio era uma falsa usurpação do trabalho de outro. Mas o facto de que a nova obra tinha passagens semelhantes ou expressões idênticas à inicial não era considerado plágio desde que a nova obra possuísse os seus próprios méritos estéticos. Depois da invenção do génio criativo, as práticas de colaboração, apropriação e transmissão foram deliberadamente esquecidas. Quando Coleridge, Stendhall, Wilde e T.S. Eliot foram acusados de plágio por incluírem expressões dos seus predecessores nas suas obras, isto reflectiu uma redefinição do plágio em concordância com a acepção moderna de autoria possessiva e propriedade exclusiva. O “roubo” de que eram acusados consiste precisamente naquilo que todos os escritores anteriores consideravam natural.

As ideias são virais, elas associam-se a outras ideias, mudam de forma e migram para territórios desconhecidos. O regime de propriedade intelectual restringe a promiscuidade das ideias e encurrala-as dentro de vedações artificiais, extraindo benefícios exclusivos da sua posse e controlo. A propriedade intelectual é uma fraude - um privilégio legal para representar-se a si próprio de um modo falso enquanto único “proprietário” de uma ideia, expressão ou técnica e para cobrar uma taxa a todos que pretendam captar, exprimir ou aplicar esta “propriedade” na sua própria produção. Não é o plágio que priva o “proprietário” do uso de uma ideia; é a propriedade intelectual, apoiada pela violência invasora do estado, que priva todos os restantes de usá-la na sua cultura comum. O fundamento para essa privação é a ficção legal do autor enquanto indivíduo soberano que cria obras originais a partir da fonte da sua imaginação, tendo por isso um direito natural e exclusivo de posse. Foucault desmascarou a autoria como sendo o princípio funcional que trava a livre circulação, a livre manipulação, a livre composição, decomposição e recomposição do conhecimento. O autor-função representa um forma de despotismo sobre a proliferação de ideias. Os efeitos deste despotismo e do sistema de propriedade intelectual que protege e preserva consistem em roubar a nossa memória cultural, censurar as nossas palavras e acorrentar a nossa imaginação à lei.

E, contudo, os artistas continuam a sentir-se lisonjeados com a sua associação a este mito do génio criativo, fazendo vista grossa ao modo como é empregue para justificar a sua exploração e alargar o privilégio da elite detentora da propriedade. O copyright coloca autor contra autor numa guerra de competição pela originalidade - os seus efeitos não são apenas económicos pois também naturaliza um determinado processo de produção de conhecimento, deslegitima a noção de uma cultura comum e danifica as relações sociais. Os artistas não são encorajados a partilhar os seus pensamentos, expressões e obras ou a contribuir para um fundo comum de criatividade. Em vez disso, protegem ciosamente a sua “propriedade” dos outros, que encaram como potenciais concorrentes, espiões e ladrões deitados à espera de surripiar e violar as suas ideias originais. Esta é uma visão do mundo da arte criada à imagem do próprio capitalismo, cujo objectivo fundamental é fazer com que as empresas possam apropriar-se dos produtos alienados dos seus trabalhadores intelectuais.

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

AGÊNCIA PIRATA




# agência pirata #
Liberdade

txt: Tiago Jucá Oliveira

O DILÚVIO fortalece seus laços com alguns conceitos de cultura e informação livres. Desde 2006 somos adeptos do Creative Commons, licença autoral que permite ao leitor reproduzir e modificar, inclusive pra fins comerciais, nossos textos e fotos que estão na revista impressa e nos canais virtuais. De lá pra cá, nos orgulhamos muito em ver nosso conteúdo republicado em sites, blogs, jornais e revistas do Brasil e do mundo. Alguns casos surpreendentes, como o site do músico Manu Chao, que reproduziu na íntegra a entrevista que o nosso blog fez com o próprio. E também a revista Cidade B, de Porto Alegre, que colou em suas páginas uma reportagem do editor d’O DILÚVIO justamente sobre licenças livres (apesar de ser uma publicação independente que nem a nossa e sofrer dos mesmos problemas que qualquer revista alternativa tenta resolver no dia-a-dia, e por isso mesmo ser considerada de nossa parte como uma mídia aliada e irmã, não podemos esquecer que na esfera comercial estamos atrás dos mesmos anunciantes, o que enaltece o fato).

Em alguns momentos nós também nos valemos desta prática, no sentido inverso, de copiar e colar reportagens, entrevistas e imagens de outros meios que utilizam a mesma licença, sem precisar pedir autorização, o que facilita, além de difundir o conhecimento e a informação. A partir de agora, a colagem será mais corriqueira. No nosso blog, textos alheios com licença livre serão reproduzidos, dando mais dinâmica ao blog. Já republicamos um do jornalista Ronaldo Martins Botelho, originalmente veiculado no Observatório da Imprensa, sobre o caso Ungaretti x Cágado Fotonaldo; e também uma ótima resenha do músico João Xavi a respeito da apresentação do 3 na Massa no festival Humaitá Pra Peixe 2009.

Para oficializar a prática, Arlei Arnt, o xuxu beleza da redação, criou há alguns meses a Agência Pirata de Giornalismo y Terrorismo Publicitário, órgão interno d’O DILÚVIO. Ele explica que “não somente serão reproduzidos textos em Creative Commons. Haverá, isso sim”, ressalta Arlei, “um profundo desrespeito às normas de direitos autorais e copyright, pois se elas são obsoletas, devemos ser verdadeiros desobedientes civis”. Ele faz lembrar que essas transgressões as leis são feitas a todo minuto em canais como You Tube e Orkut: “você assiste ao capítulo da noite passada da novela, assim como vê fotos de jogadores feitas pelos grandes jornais nos álbuns dos amigos no Orkut”. O que a Agência Pirata pretende fazer nada mais é do que escancarar aquilo que somos e não deveríamos ser não fosse ao atraso das leis: “desobedientes civis”.

A Agência, em contra-partida, não quer utilizar conteúdos sem licenças livres produzidos por mídias amigas e parceiras: “eles precisam abrir os olhos na burrice que estão cometendo, estão tão defasados em relação a isso quanto os burocratas dos direitos autorais, que poderiam ver suas idéias, excelentes por sinal, difundidas e linkadas para o original. Até o Barack Obama já aderiu ao Creative Commons”. Mesmo assim, esses sites e blogs citados acima estão relacionados no box que a Agência já ocupa no blog d’O DILÚVIO. No barra vertical à esquerda, há um box da Agência, com o resumo das últimas notícias publicadas em diversos sites, alguns parceiros e outros considerados importantes e de qualidade.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

TIAGO JUCÁ e LATUFF



Uma reportagem produzida por André Oliveira e Jeferson Pinheiro, do Coletivo Catarse, e veiculada dia 19 de março de 2008 na TV Brasil (assista ao vídeo), traz a revista O DILÚVIO como um dos exemplos de cultura livre feita no país. A matéria faz parte da série Outro Olhar, e mostra um panorama do novo jeito de abordar a questão dos direitos autorais. O programa entrevistou Tiago Jucá e Latuff

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

MANUAL DE USO DO COPYLEFT 1



# agência pirata #
1. Introdução ao Copyleft*

txt: Traficante de Sueños
Tradução: Leonardo Feltrin Foletto


Já faz algum tempo que o termo copyleft saltou das margens do mundo da informática e se instalou em todos os âmbitos da produção intelectual. Ainda que relativamente desconhecido, torpemente pronunciado pelos iniciados, o copyleft se converteu na bandeira de um movimento cultural e político que reúne toda classe de criadores e trabalhadores intelectuais: músicos, escritores, programadores, artistas, editores, juristas, midialivristas e um longo etcétera que ameaça se instalar em cada rincão da sociedade.


O termo provém de um engenhoso jogo de palavras em inglês, que parecia utilizar as artes do desvio situacionista para inverter e aproveitar a “insuspeita flexibilidade” da jurisdição anglo-saxônica do copyright. Destruindo com a ironia do original, poderia-se traduzir para o português o termo como “esquerda de cópia” ou “permitida a cópia”, ainda que sua primeira utilização esteja muito distante de ser um jogo de palavras.

No âmbito da programação [de computador], copyleft definia antes de mais nada um conceito jurídico. Assinalava que todo programa licenciado como software livre (aquele que está permitida a cópia, a modificação e a distribuição sem permissão) teria que permanecer sendo livre nas distribuições (modificadas ou não) do mesmo. O copyleft garantia assim que ninguém poderia se apropiar-se de um programa de software livre, pelo menos de acordo com a lei. Deste modo, parecia encarnar o slogan de 1968 de que “é proibido proibir”, e isso em um terreno tão impróprio como o campo jurídico!

De forma talvez abusiva, mas sem dúvida com uma efetividade social poucas vezes repetida, o copyleft passou para o terreno dos bens culturais para designar precisamente o que no software livre era uma obviedade: a garantia de certas liberdades do público, a partir da própria arquitetura das leis que reconhecem invariavelmente ao autor a possibilidade de escolher, com plena liberdade, o modelo de distribuição e exploração de suas obras. Estas liberdades são: de cópia, distribuição – comercial ou não-comercial (aspecto que para muitos é a condição imprescindível para considerar um bem cultural como livre) – modificação e geração de obra derivada.

Mas por que precisamente agora? Ao fim e ao cabo, sempre existiu criação intelectual e até bem pouco tempo atrás poderia parecer completamente bizarro falar de estas liberdades que o copyleft promete.Teríamos que dizer que o copyleft é produto de uma estranhíssima revolução tecnológica, que permitiu que os bens culturais e o conhecimento sejam independentes dos velhos formatos físicos, sendo distribuídos de forma potencialmente universal pelas redes telemáticas.

Esta quase completa “liberação da matéria” que permite a digitalização, e que em certa medida esconde a promessa de que todos podemos acessar a moderna Biblioteca de Alexandría desde o computador de nossas casas, tem sido considerada como a maior ameaça para os setores econômicos mais poderosos do nosso tempo: a indústria do software, as diferentes indústrias culturais, as indústrias de biotecnologias, etc. Sem dúvida, porque esta circulação aleatória e livre, que põe literalmente tudo ao alcance de todos, acabaria com os monopólios fixados estritamente pelas leis de propriedade intelectual e de propriedade industrial. Por isso, hoje somos testemunhas das criminosas campanhas anti-piratarias e das terríveis condenações por violação de direitos de autor, que em alguns países praticamente equipara este equívoco aos delitos contra a propriedade e a integridade física das pessoas.

Mas esta revolução que aqui chamamos de “digitalização” não somente facilita a distribuição de bens e conhecimento como, também, tem miniaturizado as tecnologias que permitem a sua produção. Assim dá-se o paradoxo que a condição de autor ou de autora tem extendido pela sociedade, até o ponto de diluir as fronteiras entre criador e espectador, autor e público. Neste ponto, o copyleft deve vir ao socorro desta massa potencial de criadores. Deve permitir ao autor que suas obras (sempre baseadas em outras) nunca sejam apropriadas por novos monopolistas, de tal modo que sejam revertidas reciprocamente para a formação de um comum (alguns chamam de procomun) que se torne uma reserva infinita para futuras criações.



Mas talvez deveriamos não avançar muito mais neste terreno. Ao fim e ao cabo, isto é só uma introdução para um guia. Um manual de uso que tem como propósito oferecer uma informação útil para a aplicação do copyleft. Somente se faz indispensável outra colocação.

O copyleft tem sido aplicado em âmbitos tão díspares como o software e a música, a edição de livros e o direito, a arte e o jornalismo. Cada âmbito da produção de uma obra intelectual tem suas próprias especificidades, que se devem a formas de produção e distribuição particulares que, inclusive, tem suas próprias legislações específicas no que diz respeito à propriedade intelectual. Não seria justo nem prático lançar todos os ingredientes da produção intelectual em um calderão de legislação, removê-los todos juntos – ainda que seja em sentido inverso ao convencional – e chamar a receita de copyleft. Cada âmbito diferente exige uma atenção própria, que deve se valer tanto das características específicas de cada área como de experiências e estratégias de implementação de licenças livres em cada compartilhamento da produção intelectual.

É por isso que este guia se organiza em capítulos monográficos dedicados inteiramente a cada área da produção intelectual: software, música, edição de textos, arte, video, direito. Como conclusão são acrescidos dois artigos que tem o propósito de desenvolver as dimensões políticas e éticas que aqui somente introduzimos. Quem visitar o índice deste guia sem dúvida encontrará alguns importantes personagens ausentes, como o jornalismo e a produção científica. No momento, só podemos dizer que esperamos solicitar a presença destes desparecidos transitórios em futuras edições.

Por fim, num livro em que se fala principalmente das condições de produção e distribuição do conhecimento, é imperdoável não fazer uma menção ao que fez possível a edição deste guia. A ideia de um guia de copyleft tem sua origem nas Jornadas Kopyleft (terceira edição de uma série que começou em Madrid e Barcelona), que ocorreu em San Sebastián entre os dias 24 e 26 de junho de 2005. O afinco do grupo organizador na hora de pensar o objetivo do guia e o propósito de cada contribuição deu começo a um trabalho que se prolongou durante o primeiro semestre de 2006. Assim, graças a colaboração inestimável dos autores, que finalmente se arriscaram a escrever, foi-se compondo um índice viável para uma publicação que “só” pretendia retratar o “estado da questão” no que se refere ao copyleft e à produção intelectual. O patrocínio de Arteleku e UNIA-arteypensamiento, que financiaram uma parte considerável deste trabalho, e o seguimento e edição dos materiais por parte de Traficantes de Sueños fizeram o resto.

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

PARTIDO PIRATA



# conection #
O partido que propõe mudanças radicais nas leis de copyright já assegurou uma vaga no Parlamento Europeu. E está prestes a ganhar a segunda.

txt: Fernando Valdez de Rivera
phts: Anders Jensen-Urstad


Com 7,13% dos votos suecos nas eleições para o Parlamento Europeu, o Piratpartiet, pela primeira vez desde sua criação em 2006, teve um de seus membros eleito. Mas um projeto de lei – já aprovado por 26 dos 27 países da União Europeia – que amplia o número de parlamentares pode dar aos piratas suecos mais uma cadeira, que será entregue a Amelia Andersdotter, segunda candidata mais votada do partido. Com apenas 21 anos, Amelia representa uma geração que pretende trazer novos ares ao “cemitério de elefantes” europeu.

Qual é, em termos práticos, o papel do Parlamento Europeu hoje?

O papel do Parlamento Europeu está constantemente mudando e se expandindo. Sendo o único corpo eleito da União Europeia, muitos dos líderes do bloco sentem que é importante dar ao Parlamento um papel maior nas decisões do bloco e na criação de leis comuns. O Parlamento Europeu costumava ser uma espécie de “cemitério de elefantes” para os políticos. Antigamente, na década de 1980 e antes disso, ele funcionava como consultor, isto é, apenas um lugar onde se ia para pedir opiniões. Os estados-membros acreditavam que era importante que aqueles políticos velhos e experientes se sentassem lá. Agora é um corpo vibrante, eleito, e obviamente podemos esperar uma mudança etária em conformidade com isto. Acredito que a marca de “cemitério de elefantes” irá embora. Já temos visto muitos parlamentares jovens eleitos na Suécia, Alemanha e outros países.

E na questão-chave do Piratpartiet – as reformas nas leis de copyright -, como atua o Parlamento hoje?

O Parlamento Europeu tem influência direta nas questões sobre Direitos Autorais, o que significa que eles têm que aprovar uma lei de copyright para que ela seja aceita na União Europeia. A única questão que está sendo revista no momento é como definer exceções e limitações na legislação de copyright. O debate sobre copyright está tão infectado que a União Europeia nao pode mais continuar endurecendo as leis – e francamente, não deve. Espero que os rumores que ouvi sobre visões mais tolerantes a respeito de exceções e limitações signifique que a União Europeia está finalmente quebrando seu dogma “copyright-deve-sempre-ser-fortalecido-e-nunca-se-tornar-mais-útil-à-sociedade”.

Caso você se eleja, obviamente será uma voz discordante lá. Você acredita ser possível atrair a simpatia dos membros mais velhos?

Creio que um membro mais jovem no Parlamento Europeu tem muitas vantagens sobre os antigos. Ele possui novas perspectivas, talvez esteja mais próximo da realidade dos jovens da Europa de hoje. Desta forma, acredito que os membros mais velhos estejam inclinados a ouvi-lo. Claro, isso significa que você tem muito mais o que provar – eu acho -, mas, tendo conseguido isto, você será “o cara”.

Dez anos se passaram desde que o Napster era o “grande negócio” da pirataria não-comercial. Desde então, tivemos o desenvolvimento do peer-to-peer, torrents e, recentemente, a organização política dos piratas – inicialmente com o Piratpartiet sueco e, agora, se espalhando por outros países. Como você acha que esta guerra do copyright estará daqui dez anos?

Só posso ter esperanças, claro, mas acho que veremos uma aproximação mais flexível entre o acesso livre e a legislação sobre compartilhamento. Espero que tenhamos uma visão mais produtiva sobre como o conhecimento pode beneficiar a sociedade, ao invés de discutirmos sobre como a sociedade deve bloquear o conhecimento.

Mas independente de os legisladores pensarem ou não no conhecimento de maneira construtiva, creio que continuaremos vendo novos softwares de compartilhamento de arquivos e novas milícias de cidadãos, por assim dizer, certificando-se de que o compartilhamento do conhecimento, da cultura, das artes e da informação continue intacto. É um aspecto importante dos seres humanos compartilhar impressões e expressões com seus iguais. Seria muito triste se a indústria do copyright conseguisse expelir isso de nossa cultura.

Você acredita que iniciativas como o Creative Commons são suficientes para mudar o pensamento global sobre copyright?

O Creative Commons já mudou a maneira com que as pessoas pensam sobre copyright. CC é um movimento que já se estabeleceu e é muito apreciado, especialmente, por artistas, fotógrafos, músicos, escritores que vêm essas atividades como hobby, mas também funciona para profissionais.

Em relação a esse segundo grupo: é possível ganhar dinheiro adotando a ideia de “Alguns Direitos Reservados”?

Escritores como o norte-americano Rudy Rucker e o canadense Cory Doctorow [autores de ficção científica] são exemplos de que é possível viver de seus trabalhos adotando essa perspectiva. Mas como isso funcionaria de maneira geral? Não sou uma expert em estratégias de negócios, mas acredito que na música, por exemplo, as performances ao vivo podem se tornar uma fonte de renda muito mais importante no futuro. Se os artistas souberem usar a internet, será mais fácil ganhar uma audiência global vasta.

Qual o ponto crucial que deve ser reformulado nas leis de copyright?

A cópia para uso privado precisa ser legalizada. Distribuir, remixar e samplear material protegido para propósitos não-comerciais precisa deixar de ser crime. Acho que esse é o aspecto mais importante.

Em sua plataforma de campanha, você disse que deseja uma “remoção completa do sistema de patentes”. Que benefícios isso pode trazer à sociedade?

Remover o sistema de patentes facilita a transferência de tecnologia, por exemplo. Também pode criar um ambiente mais competitivo no mercado.

Não acho que o mundo precisa se livrar de um sistema que proteja os inventores, mas estou certa de que o sistema de patentes que temos hoje está tão deturpado que não há realmente nenhuma maneira de salvar as partes boas e retirar as ruins. É por isso que acredito que este sistema deve acabar.

As patentes hoje não são usadas para proteger inventores ou promover invenções, mas para evitar que invenções e inventores trabalhem apoiados no conhecimento anterior. Patentes são também utilizadas como uma forma de impedir a competição, criando um fardo financeiro para aqueles que desejam licenciar métodos e tecnologia. Assim, os preços de produtos e serviços são elevados aos céus e isso não traz benefícios aos consumidores finais, nem aos inventores.

Isto precisa acabar, e talvez possamos desenvolver outro sistema que cumpra seu verdadeiro propósito.

Entre suas propostas, você menciona o acesso de material protegido a pessoas portadoras de dificuldades. Como a lei restringe esse tipo de acesso e o que poderia ser feito?

Por exemplo: no caso de deficientes visuais, é preciso que se crie um sistema de copyright onde seja fácil para organizações e governos disponibilizarem livros em braile ou em áudio. Precisa ser barato, tanto para os consumidores como para o produtor. Isto é, taxas de licenciamento para esse tipo de produção deveriam ser completamente removidas. Isso também se aplica a bibliotecas. É importante que todas elas tenham, para cada obra convencional, outra em braile ou áudio.

Todas bibliotecas e arquivos deveriam ser isentos de taxas. Eles fazem um bem público ao arquivar conhecimento e distribui-lo para as pessoas. Talvez faça sentido que eles comprem os livros que precisam, mas isto é um custo único, não uma taxa permanente.

No momento, existe algum projeto de lei que defenda essa flexibilização no copyright para facilitar o acesso a pessoas com algum tipo de deficiência?

Internacionalmente, a questão mais importante no momento é o “Tratado para os visualmente debilitados” que, infelizmente, vem enfrentando oposição dos Estados Unidos e de parte da União Europeia. Este tratado poderia asegurar acesso mais fácil para deficientes visuais a material protegido por copyright.

Muitos tratados internacionais que legislam sobre copyright são imprudentes ao impor fortes restrições ao uso do conhecimento. São raros os casos em que se analisam como a distribuição do conhecimento, ou a acessibilidade, poderiam beneficiar a sociedade e o mercado.

Você é uma estudante de Economia. Pensando como economista, você acredita que a indústria de entretenimento, especialmente a da música, poderia sobreviver em um mundo com conteúdo pouco protegido?

Acredito que eles têm de pensar em novas estratégias de negócios. O mercado nunca beneficiou aqueles que crescem e se estagnam. Ele beneficia aqueles que têm capacidade de se renovar constantemente. É isso que a indústria terá que fazer.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

BLOGAGEM LIVRE







A elite blogosférica brazuca não gosta de compartilhar seu conteúdo 22Mar09

Por Ricardo Cavallini

Esta semana, depois de ter escutado algumas reclamações de posts copiados, resolvi fazer um levantamento informal sobre a blogosfera brazuca. O resultado me surpreendeu, fazendo coro com as reclamações. A maioria dos blogueiros opta pelo uso do Copyright, licença conhecida pela rigidez com que protege o conteúdo e, justamente por isso, amada pela indústria de entretenimento.

Claro que cada um faz o que quer com sua própria obra. De certa forma, muitos já estão contribuindo colocando sua criação de graça na web. Por isso, este post não é uma crítica a estes blogs, mas uma defesa para qualquer modelo de licença que facilite o compartilhamento.


Não escondo minha preferência pelo Creative Commons (CC). Nem teria como, afinal, meus blogs, textos e livros estão saindo usando esta licença. A licença CC é uma ótima opção, permitindo compartilhar o conteúdo e, caso desejado, exigir crédito, negar a alteração do conteúdo (para evitar distorções) e ainda proibir que alguém use o fruto de seu trabalho para ganhar dinheiro.

Tirando os blogs que fizeram acordos comerciais com portais, cuja negociação seria complicada, não consigo ver o uso do CC afetando o modelo de receita dos blogueiros. Também não acredito que o compartilhamento poderia prejudicar a imagem ou a audiência dos mesmos.

O levantamento feito no dia 20/02, quando o texto foi escrito. Através do Google, usei três listas de “melhores” e “maiores” blogs brasileiros. Visitei mais de 100 blogs, por isso, independente da metodologia ou fidelidade de cada lista, acredito ter conseguido uma boa amostragem do que é considerada a elite blogosférica brasileira. A lista dos blogs abaixo, em ordem alfabética. Ah, e por favor me perdoem se comi alguma bola na pesquisa.

Resultados:

Não permite: 54 (42 %)
Não permite (via termos do portal): 6 (5 %)
Não permite (não diz seus termos): 40 (31 %)
Permite: 28 (22 %)

Visto que a maior parte destes blogs é mantido por pessoas de uma geração que defende o “Share”, o “Free” e até mesmo a pirataria para si mesmos, esta postura seria contraditória como o Neto defendeu?

Acredito que uma boa parte deles faça por desconhecimento. Inclusive alguns que estão usando o Creative Commons, pois uma das reclamações que escutei veio de um blog que usa CC e teve seu conteúdo copiado por outro que indicou autoria, colocou link e ainda não modificou o conteúdo.

Para não deixar o post no vazio, entrevistei meu ilustríssimo amigo Dr. Eduardo Salles Pimenta. Um dos maiores especialistas em direito autoral no Brasil. A entrevista segue abaixo.
1) É possível descrever rapidamente as principais diferenças entre o Copyright e a Lei de Direito Autoral brasileira?


O Copyright é uma expressão inglesa que significa direito de cópia, que está afeto aos direitos patrimoniais. A lei de direitos autorais brasileira segue a diretriz do direito francês: Droit D’auteur, que prevê além dos direito patrimonial o direito moral do autor (este consiste no direito a paternidade, direito de impedir a transformação e requisição de exemplar único para fins de exposição)

2) Se no Brasil o registro da obra é facultativo, podemos entender que mesmo sem qualquer descrição de termo de uso, o conteúdo publicado em sites/blogs estaria protegido pela lei 9.610/98?

O registro realmente é facultativo, conforme disposto no art.18 da lei 9610/98:

Art. 18 A proteção aos direitos de que se trata esta lei independe de registro.

Cabe ressaltar que os conteúdos de sites e blogs são protegidos como obra intelectual. Vejamos no art. 7 e 29 da lei 9610/98:

Art. 7º. São obras intelectuais protegidas as criações do espírito expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro, tais como:
I – os textos de obras literárias, artísticas ou cientificas;
(…)
(aqui lembro a proteção do código fonte e a compilação de dados ou outro material que menciona o Decreto n. 1355/94, cujo o conteúdo é o ACORDO SOBRE ASPECTOS DOS DIREITOS DE PROPRIEDADE INTELECTUAL RELACIONADOS AO COMERCIO (ACORDO DE TRIP’s ASSINADO NO ÂMBITO DO GATT), que em Artigo 10: Programas de Computador e Compilações de Dados
1. Programas de computador, em código fonte ou objeto, serão protegidos como obras literárias pela Convenção de Berna(1971).
2. As compilações de dados ou de outro material, legíveis por máquina ou em outra forma, que em função da seleção ou da disposição de seu conteúdo constituam criações intelectuais, deverão ser protegidas como tal. Essa proteção, que dará sem prejuízo de qualquer direito autoral subsistente nesses dados material.)

§ 1 Os programas de computador são objeto de legislação específica, observadas as disposições desta lei que lhes sejam aplicáveis.
§ 2 A proteção concedida no inciso XIII não abarca os dados ou materiais em si mesmos e se entende sem prejuízo de qualquer direitos autorais que subsistam a respeito dos dados ou materiais contidos nas obras.
(…)

Frisando que o uso é previsto no artigo 29, observado a autorização previa:

Art. 29. Depende de autorização prévia e expressa do autor a utilização da obra, por quaisquer modalidades, tais como:
I – a reprodução parcial ou integral;
(…)
IX- a inclusão em bancos de dados, o armazenamento em computador, a microfilmagem e as demais formas de arquivamento do gênero; (o disco rígido é uma ferramenta de armazenamento)
X – quaisquer outras modalidades de utilização existentes ou que venham a ser inventadas. (aqui se insere a internet)

3) Usar o símbolo © (Copyright) faz alguma diferença prática?

O uso do referido símbolo, indica a reserva de direitos autorais, ou seja demanda autorização. Decerto que por raciocínio lógico, toda criação intelectual demanda autorização prévia, executando aquelas com a indicação do Creative Commons – que também vem indicado.

4) No Brasil, o Creative Commons é levado a sério no mundo jurídico especializado em licenças autorais?

Sim, pois o Creative Commons é uma autorização tácita dada pelo titular de direitos autorais.

5) Se um site/blog usa o Copyright e deixa claro ter todos os direitos reservados, mas também diz usar Creative Commons, outras pessoas podem copiar seu conteúdo?

Podem usar a criação nos limites do Creative Commons indicado, ou seja, para tudo desde não haja restrições especificas e sempre observado os direitos morais do autor.

6) Como a lei entende a cópia não autorizada?

É um ato de PIRATARIA. (termo definido pelo Decreto nº 5.244, de 14 de outubro de 2004, que disposto no:

Art 1º O Conselho Nacional de Combate à Pirataria e Delitos contra a Propriedade Intelectual, órgão colegiado consultivo, integrante da estrutura básica do Ministério da Justiça, tem por finalidade elaborar as diretrizes para a formulação e proposição de plano nacional para o combate à pirataria, à sonegação fiscal dela decorrente e aos delitos contra a propriedade intelectual.

Parágrafo único. Entende-se por pirataria, para os fins deste Decreto, a violação aos direitos autorais de que tratam as Leis nºs 9.609 e 9.610, ambas de 19 de fevereiro de 1998.)

Art. 5º. Para os efeitos desta lei, considera-se:

(…)
VI- reprodução – a cópia de um ou vários exemplares de uma obra literária, artística ou científica, ou de um fonograma, de qualquer forma tangível, incluindo qualquer armazenamento permanente ou temporário por meios eletrônicos ou qualquer outro meio de fixação que venha a ser desenvolvido;
(…)
VIII- obra:
(…)
g) derivada – a que, constituindo criação intelectual nova, resulta da transformação de obra:

7) Se o blogueiro filma os amigos dançando uma coreografia qualquer, mas usando música que não tem direito autoral nem autorização de uso?

Se faz a exibição publica sem a autorização é ato de Pirataria.

8)Se o blogueiro faz uma fotonovela de humor, usando fotografias que não tem direito autoral nem autorização de uso, criando uma historinha via frases em balões (tipo historia em quadrinhos)?

Idem.

9) Se o blogueiro criar um novo conteúdo, mas usando como base um conteúdo que não tinha direito, apesar de estar cometendo o ato de pirataria, ele teria direito sobre o novo conteúdo?

Esta nova obra é classificada como obra derivada. Ela pode ser uma obra fruto de pirataria, porem é violação que só pode ser reivindicada pelo titular de direitos autorais da obra anterior, na qual a obra derivada se baseou. Algo muito difícil na internet.
Sobre a titularidade da obra derivada o autor é titular sobre os direitos autorais dela (direito sobre o novo conteúdo) e brigar com usá-la sem autorização.

10) O avanço trazido pela Internet e outras tecnologias tornou a legislação brasileira obsoleta?

Não posto que a lei prevê a forma intangível no seu art. 7, e o diversos uso no art. 29 de forma exemplificativa, portanto é uma lei de princípios estando atual

11) Qual a leitura recomenda para os leigos que gostariam de se aprofundar no assunto?

O livro Princípios de Direitos Autorais – Livro I : Um século de proteção autoral no Brasil de 1898-1998, ed. Lumen Juris – Rio – 2004.

segunda-feira, 15 de junho de 2009

PUTAS A FODER



# manda chuva #
Ainda o chato assunto do diploma

txt: Tiago Jucá Oliveira


Primeiramente, eu gostaria de criticar e elogiar o pessoal do Jornalismo B. Criticar por que acho que debater exigência de diploma de jornalismo não leva a nada. Não vai mudar porra nenhuma, independente da obrigação ou não. E também pelo fato que não sou eu a pessoa indicada pra defender um dos lados das questões. Não pertenço a nenhuma entidade, movimento, coletivo ou ong que defenda a não obrigatoriedade. E por último, criticar por ter chamado uma pessoa do sindicato que não quer que vocês exerçam o jornalismo. Duvido que haja mais de cinco blogs, em Porto Alegre, melhores que o Jornalismo B. E eu, uma pessoa formada, sou muito pior fotojornalista do que a Thais, que é bióloga, e que faz fotos pro Jornalismo B, prO DILÚVIO e pro Jornal Já. Se depender do sindicato, seus dias de jornalismo e fotojornalismo estão contados. Vocês convidaram o inimigo pra trincheira.

Mas eu os elogio ao mesmo tempo, pois debater jornalismo sempre é bom. E também agradeço as palavras do Alexandre Lucchese sobre minha pessoa e sobre O DILÚVIO ao nos qualificar como um dos debatedores. Diz ele, no próprio blog, semana passada: “O Jucá e sua O DILÚVIO representam o que há de mais independente, autônomo e livre na imprensa de Porto Alegre – quer o próprio Jucá queira reconhecer isso ou não. Desde seus temas e pautas, até sua organização e ’sede’, passando pela diagramação e textos, O DILÚVIO congrega a grande maioria das características que qualquer veículo alternativo e informal gostaria de ter. E, acredito, é alguém que tem este tipo de experiência durante tantos anos que poderá levantar esta discussão de maneira genuinamente rica perante a entidade que busca formalizar o exercício do jornalismo.”

E acho que ele tem uma certa razão no que disse. O DILÚVIO é uma referência nacional em cultura livre, em reciclagem de idéias, em autonomia editorial, em jornalismo cultural. Já ganhamos uma bolsa da Fundação Avina pra produzir uma série de reportagens sobre licenças livres e multiplicação do conhecimento. Entre os 50 veículos contemplados com a bolsa de investigação, somente O DILÚVIO era uma publicação independente, no meio de grandes como CNN, Rádio CBN, Carta Capital, El Clárin, La Nación, Jornal do Conmércio, etc.

Também já fomos convidados pra debater jornalismo, com outras 40 experiências bem sucedidas de modelos alternativos de comunicação, no evento Onda Cidadã, promovido pelo Itaú Cultural. Recentemente, fomos escolhidos a 6º melhor publicação impressa do país, através do Prêmio Dynamite.

Portanto, se não sou o apropriado pra debater diploma, tenho uma certa credibilidade pra discutir jornalismo. Também temos forte personalidade pra dizer que ninguém vai nos obrigar a ter somente jornalistas com diploma em nossa revista. Leis que não consideramos justas, nós não obedecemos. Isto se deve ao nosso maior inspirador que é Henry Thoreau, autor do clássico A Desobediência Civil. Diz ele, em certo trecho do livro:

"Deve o cidadão, sequer por um momento, ou minimamente, renunciar à sua consciência em favor do legislador? Então por que todo homem tem uma consciência? Penso que devemos ser homens, em primeiro lugar, e depois súditos. Não é desejável cultivar pela lei o mesmo respeito que cultivamos pelo direito."

Conclui o mestre: "A lei jamais tornou os homens mais justos, e, por meio de seu respeito por ela, mesmo os mais bem-intencionados transformam-se diariamente em agentes da injustiça."

O DILÚVIO é uma revista que comete dezenas de desobediências, ilegalidades por dia. É só dar uma olhada na nossa comunidade no orkut, que tem quase 3.500 membros subversivos. Milhares de downloads de músicas protegidas pelo direito autoral são realizados a partir dos links disponibilizados lá na comunidade. Nosso perfil no orkut já foi denunciado por desrespeito aos direitos autorais e excluído duas vezes. Já criamos o terceiro, e rapidinho já chegamos a 500 amizades solidárias. E criaremos pela quarta vez, se for necessário.

No nosso blog, estamos cometendo outro delito, quase que diariamente. Utilizamos fotos, ilustrações e charges de outras pessoas sem pedir permissão e sem dar créditos ao autor. Motivo: são obras licenciadas em copyright, e não em Copyleft, Domínio Público ou Creative Commons. A gente faz pirataria e plágio com aqueles que não liberam a obra pra livre reprodução. E incentivamos isso. A propriedade é um roubo, disse Proudhon. Eu digo: a propriedade intelectual também é um roubo.

Duas pessoas da redação criaram uma obra que critica a desgovernadora Yedinha, e omitimos o nome destas duas pessoas. Ela está lá, nua, esperando que qualquer pessoa a use, que a plagie. E já vimos que ela já se espalhou por aí, no orkut já vi vários álbuns de fotografias com a obra lá, como se fossem de autorias de outras pessoas, e não nossa.

Não queremos ser donos de obras jornalísticas e artísticas. Queremos que as idéias se espalhem aos milhões. Pra mim é muito mais importante ver uma idéia minha sendo difundida e ampliada, modificada pra melhor e plagiada, do que dizer e obrigar que eu sou o autor dela. Esses dias eu vi no site do jornal O Globo a reprodução integral dum texto que já havia sido publicado na revista O DILÚVIO. Eles não citaram o autor da matéria. Problema nisso? Pra gente não.

Manu Chao, grande referência musical pra gente, também já reproduziu no seu site a entrevista que fizemos com ele, na íntegra e citando a fonte, sem nos pedir permissão, pois como usamos uma licença Creative Commons, já está pré-autorizada pra qualquer pessoa do mundo reproduzir nossas fotos e reportagens, da maneira como ela quiser, sem precisar nos contatar pra pedir autorização. Depois de publicado, nosso conteúdo deixa de ser de nossa propriedade e passa a ser do mundo. Assim como nossos filhos, dos quais somos pais, mas não somos donos. Depois de criados, eles também passam a ser do mundo em que vivem, sujeitos a ser justamente o oposto daquilo que os pais eram.

Quando alguém pega uma idéia nossa, não deixamos de possuir esta idéia, não nos sentimos roubados ou sem idéias. Assim como alguém acende uma vela na nossa, a gente não fica sem luz. Quem disse essa frase bonita não fui eu, foi o Thomas Jefferson, e está em domínio público. Se estivesse em copyright, eu diria que a frase era minha, ou não citaria o autor.

Enquanto isso, no senado federal, tramita o projeto de lei Azeredo, que vai vigiar e punir qualquer pessoa que fizer download ilegal de conteúdo protegido pelos direitos autorais. Se eu quiser fazer uma resenha do novo álbum da Sandy Junior, a filha do Chitãozinho e Xororó, eu vou precisar baixar o disco na web. A gravadora e a produtora dela não nos enviam CDs. Enviam somente a grandes meios de comunicação. Se eu quiser agir de forma legal, ou compro na loja, ou pago pra baixar no itunes. Isso vai me custar mais de 20 reais, quase 30. Ou seja, eu vou ter que pagar pra ajudar na divulgação do novo disco dela. Quem deveria me pagar era ela, pra eu ter que ouvir aquela bosta e ainda escrever uma resenha.

Ao mesmo tempo, aqui na província, um professor universitário e jornalista é censurado por uma empresa, que usa um cascateiro como laranja. A crítica mais contudente ao péssimo jornalismo que esta empresa faz está calada. Dizem que é uma pessoa processando outra por difamação. Não. É uma empresa censurando um jornalista por trazer a verdade a tona.

Há somente em Porto Alegre 26 emissoras de televisão e rádio com as outorgas já vencidas. Quem diz isso não sou eu, é a Anatel, é só entrar no site deles e conferir. E pra trabalhar nessas empresas que deveriam estar fechadas pela justiça, há pessoas aqui defendendo que se tenha o diploma. Como não vejo muita diferença em uma quadrilha de traficantes e estas emissoras, creio que vá se pedir diploma pra ser avião de traficante. Jornalista que trabalha numa dessas emissoras é um criminoso também. É cúmplice disso que eu qualifico como o pior jornalismo já feito na história no país. Nem nas ditaduras de Vargas e dos militares se fazia coisa pior.

Este ato contra a liberdade de expressão vai calar diversos comunicadores de rádios comunitárias. Já são calados na base da porrada pelo governo Lula, que é que mais fechou rádios comunitárias. Rádios comuntárias que são criminalizadas pelas rádios comerciais, são denunciadas e chamadas de piratas. Pirata é a rádio Gaúcha, a rádio Guaíba, a rádio Band, a rádio Cultura, a rádio da Universidade, a rádio Atlântida, a rádio Itapema, a RBS TV, a Band TV, etc. Todas elas estão com concessão pública vencida. Note, há duas rádios públicas que deveriam estar fora do ar. E nas rádios comerciais, governos municipais, estaduais e federal investem verbas publicitárias, pagas pelo nosso bolso.

E fiquei sabendo semana passada que meus amigos da Black Sonora e a Lica Tito tiveram que conseguir liminar pra poder se apresentar ao vivo. O que mais vai ser preciso ter diploma pra poder se expressar? Só falta os tucanos apresentarem um projeto que impeça analfabetos de concorrerem a presidência.

Então você soma tudo disso: censura a jornalistas + limitar que somente uma elite possa se comunicar + fechamento de rádios comunitárias + grandes emissoras funcionando sem outorgas + proteção da não difusão do conhecimento + proibir artistas de se apresentarem ao vivo + concentração de emissoras de radio e TV em poucas mãos = menos democracia e péssimo jornalismo

Esta exigência besta de diploma quer é calar a voz da maioria. Somente uma elite formada e diplomada poderá ser capaz de fazer o serviço sujo de uma dúzia de famílias que comandam a comunicação e a mídia no Brasil. Não me venham com esse papo furado que é preciso diploma pra segurar um microfone, alisar o cabelo e dizer que hoje vai chover na fronteira e fazer frio na serra. O cara que tinha mais talento pra fazer isso não tinha diploma de jornalista, e hoje é deputado estadual. Era muito mais divertido ele do que essas menininhas formadas na Fabico ou Famecos de cabelo alisado. Qualquer Maísa dá a previsão do tempo.



TOMATE CRU

Duas meninas comentaram, uma no nosso blog, e outra no twitter: então me devolva o dinheiro que gastei na faculdade. Não pude deixar de responder: se tivesse estudado como eu estudei, tinha passado numa federal. Porra, a preocupação delas é somente dinheiro. Em nenhum momento parou pra pensar que elas, com diploma, tem uma qualificação a mais de quem não tem.

Não é exigido, pra ser jornalista, estudar inglês, francês e castelhano, fazer mestrado e doutorado, tirar um curso de fotografia no SENAC, freqüentar algumas aulas na história, cursar photoshop, ler livros sobre a profissão que os professores nunca exigiram ou jamais recomendaram. Vou eu pedir a livraria meu dinheiro de volta porque a lei não obriga ler Darcy Ribeiro pra exercer a profissão de jornalismo? Claro que não. Eu procurei me qualificar. Por isso que entrei numa faculdade. Foi lá que conheci, além do Darcy Ribeiro, o Eric Hobsbawm e o Marshal McLuhan.

O presidente da Fenaj ilustrou um caso pra defender a obrigatoriedade do diploma. Um cara que pediu carteira de jornalista, mas que era analfabeto. Eu pergunto: você tem medo de concorrer e perder emprego pra um cara analfabeto? Então vaza, meu filho, enquanto é tempo. Desista do jornalismo e vá fazer outra coisa, vá plantar batatas.

Também tem alguns que dizem que blog não é jornalismo, eu pergunto: mas pra trabalhar no blog da folha online? Ou num blog da rede globo? Neste caso blog é jornalismo? Levo a crer que jornalismo então é somente aquilo feito na grande mídia. O blog da Petrobrás foi um bom exemplo esta semana de um bom jornalismo, muito melhor que os jornais. O blog d’O DILÚVIO, o blog do Jornalismo B, o blog do Celeuma, o blog do Marcelo Tas, o blog do Luis Nassif, o blog do Wladymir Ungaretti, entre outros, não são jornalismo? Digo mais: se você estuda jornalismo e ainda não tem um blog, escolheu a profissão errada.

E livros como “Estação Carandiru”, do Drauzio Varela; “Noites Tropicais” e “Tim Maia – Vale Tudo”, do Nelson Motta; “Os Sertões”, de Euclides da Cunha; “Dez Dias que Abalaram o Mundo”, de John Reed; “A Sangue Frio”, de Truman Capote; “O Mistério do Samba” e “Mundo Funk Carioca”, de Hermano Vianna. Todos esses livros, entre tantos, não são jornalismo? Preciso de diploma pra escrever um livro reportagem?

E filmes? “Ônibus 174”, do José Padilha; “Notícias de uma Guerra Particular”, do João Moreira Salles. Estes filmes não são jornalismo? Se forem, preciso ter diploma pra fazer um documentário?

E quanto a esses caras que vou citar. MINO CARTA – Quatro Rodas, Carta Capital, Veja; ANDRÉ FORASTIERI – Bizz, Set, General, Conrad, Folha, MTV; ZIRALDO – O Pasquim, Bundas, Palavra; MACOS FAERMAN – Versus, Singular e Plural; SEBASTIÃO OLIVEIRA – Caac – centro de artes e alternativas de cidadania; ELIEZER MUNIZ – projeto canal motoboy; LOBÃO – Outra Coisa, MTV; IDELBER AVELAR – brilhante cobertura dos ataques israelenses à Palestina; REGINA CASÉ – Central da Periferia; HERMANO VIANNA – Música do Brasil, Overmundo e Central da Periferia; ARNALDO JABOR – Jornal da Globo; RONALDO LEMOS - Overmundo. Em comum entre todos estes nomes é que nenhum deles tem diploma. Vamos queimar a Carta Capital? Vamos tirar o Overmundo do ar?

Também dizem que assim que não for mais exigido o diploma, as empresas vão demitir os jornalistas formados. Alguém aqui acredita que a Globo vai demitir o Caco Barcelos ou o Carlos Eduardo Dornelles? Alguém acredita que O DILÚVIO não vai mais querer entre seus colunistas nomes como Bruno Lima Rocha e Wladymir Ungaretti. Só os medíocres acreditam nisso, pois só eles tem medo de perder emprego, porque sabem que são medíocres.

Nessa sexta que passou houve outro debate sobre o assunto, e ouvi várias vezes a palavra patrão. Que com diploma o patrão não vai nos explorar, vai pagar melhor, não vai nos demitir pra contratar outro em seu lugar. E notei que a grande preocupação dessas pessoas é não perder emprego nem ganhar mal na grande mídia. Elas não querem abolir a grande mídia, não querem boicotar a grande mídia. Não. Elas querem continuar sustentando, com diploma e mais qualidade, a grande mídia. Quere continuar dando coro a manipulação, engrossando o caldo da mentira. Mas com diploma, claro, a mentira terá mais qualidade. Um cara que não estudou jornalismo dificilmente estudou e sabe os quatro padrões básicos de manipulação utilizados pela grande imprensa. Ou será que eles acham que vão inverter a pauta do MST para um novo ângulo, para uma nova ótica?

Cito o grupo Krisis, autor do brilhante livro Manifesto Contra o Trabalho: “Trabalho e capital são os dois lados da mesma moeda. A esquerda política sempre adorou entusiasticamente o trabalho. Ela não só elevou o trabalho à essência do homem, mas também mistificou-o como pretenso contra-princípio do capital. O escândalo não era o trabalho, mas apenas a sua exploração pelo capital. Por isso, o programa de todos os "partidos de trabalhadores" foi sempre "libertar o trabalho" e não "libertar do trabalho". Tanto do ponto de vista do trabalho quanto do capital, pouco importa o conteúdo qualitativo da produção. O que interessa é apenas a possibilidade de vender de forma otimizada a força de trabalho. Os trabalhadores das usinas nucleares e das indústrias químicas protestam ainda mais veementemente quando se pretende desativar as suas bombas-relógio. E os "ocupados" da Volkswagen, Ford e Toyota são os defensores mais fanáticos do programa suicida automobilístico. Não só porque eles precisam obrigatoriamente se vender só para "poder" viver, mas porque eles se identificam realmente com a sua existência limitada. Para sociólogos, sindicalistas, sacerdotes e outros teólogos profissionais da "questão social", trabalho forma a personalidade. Personalidade de zumbis da produção de mercadorias, que não conseguem mais imaginar a vida fora de sua Roda-Viva fervorosamente amada.”

O jornalista Hélio Paz, que pensa parecido comigo sobre o diploma, disse: “os sindicatos vivem essa atrasada visão dicotômica de burguesia x proletariado quando o jornalista JAMAIS se constituiu em um proletário ou em um escravo miserável. Além disso, não enxergam bem outra possibilidade que não seja a de serem empregados injustiçados de um patrão totalitário.” Citei ele porque também ouvi muitos argumentos do tipo “jornalista é diferente de comentarista e colunista; o primeiro faz reportagens e os outros opinam”. Então jornalista não deve opinar? Jornalista é o pau mandado do editor que o coloca pra cobrir o que interessa a empresa?

Vou procurar adaptar a situação do jornalismo pra outra profissão bem parecida com a nossa. Digamos que haja diploma pra ser prostituta. Você acredita que uma diplomada diz pro patrão dela na zona e diz: “olha, eu só transo com o Brad Pitt e com o Rodrigo Santoro”. Mesmo com diploma, ela vai transar com qualquer um que pagar, seja gordo ou magro, alto ou baixo, bonito ou feio, vascaíno ou flamenguista, cabeludo ou careca, cepacol ou desdentado. E se pensar que nem pensam os favoráveis a exigência de diploma, vai fazer passeata em Brasília pra impedir que qualquer puta sem nível superior faça programa nas esquinas.

Eu digo: com diploma ou sem diploma, quem pensa assim vai sempre acabar se fudendo. E sendo assim, só posso dar este conselho: jornalista com caráter de puta que nem você tem mesmo é que tomar no cu.

quinta-feira, 11 de junho de 2009

NOTAS INÉDITAS SOBRE COPYRIGHT E COPYLEFT




# agência pirata #

Copyright x Copyleft

txt: Wu Ming
trdç: Reuben da Cunha Rocha


1. Os dois lados do falso dilema

Começando pelo fim: o copyleft surge da necessidade de unir duas demandas básicas; podemos dizer duas condições indispensáveis à convivência civil. Se deixássemos de lutar por essas duas necessidades, deixaríamos de sonhar com um mundo melhor.

Não há dúvida de que a cultura e o conhecimento devem circular o mais livremente possível, e de que o acesso às idéias deve ser direto, equânime e livre de discriminações de classe, censura ou nacionalidade. Obras intelectuais não são apenas produtos do intelecto, é preciso que elas também produzam intelecto, disseminem conceitos e idéias, fertilizem mentes de modo que novas formas de pensar e imaginar sejam passadas adiante. Esta é a primeira necessidade. A segunda é que o trabalho seja remunerado, o que inclui o esforço de artistas e narradores. Quem quer que produza arte ou narrativas tem o direito de sobreviver do seu trabalho, de modo não ofensivo à sua própria dignidade. Obviamente, esta é só a melhor das hipóteses.

É conservador acreditar que tais necessidades sejam como dois lados irreconciliáveis de um dilema. “Não dá pra fazer as duas coisas”, dizem os defensores do copyright como se fosse óbvio. Para eles, copiar livremente significa apenas ‘pirataria’, ‘roubo’, ‘plágio’ – e esqueça a remuneração do autor. Se o trabalho circula gratuitamente, menos cópias são vendidas e menos dinheiro ganha o autor. Um silogismo bizarro quando visto de perto. A lógica deveria ser outra: se o trabalho circula gratuitamente, as pessoas gostam e o divulgam, a reputação do autor se beneficia disso e sua influência na indústria cultural (e não apenas nela) cresce. É um ciclo de benefícios. Um autor respeitado é constantemente convidado a fazer apresentações (despesas reembolsadas) e conferências (pagas); ele é entrevistado pela mídia (sendo promovido); cargos acadêmicos (remunerados) são oferecidos; assessorias (remuneradas), cursos de escrita criativa (remunerados); ao autor se torna possível negociar condições mais vantajosas com editores. Como estas coisas poderiam prejudicar a venda de livros?

Vamos falar de música. Ela circula gratuitamente, ela chama a atenção das pessoas; quem quer que a tenha feito passa a ser conhecido, e se o autor souber explorar isto passa então a ter a oportunidade de se apresentar (remunerado) com maior frequência e em mais lugares, conhece mais pessoas e consequentemente tem mais apoio, se ‘construir um nome’ passará a ser convidado para compor trilhas sonoras (remuneradas), fazer festas como DJ (remunerado), trabalhos de design sonoro para eventos – pode até acabar dirigindo festivais (remunerados) etc. Se pensarmos nos artistas pop, podemos incluir o que se ganha com camisetas, vendas on-line etc.

Assim se resolve o ‘dilema’: as necessidades dos consumidores são respeitadas (eles têm acesso à obra), como o são as dos artistas (beneficiados artística e financeiramente) e as da indústria (editores, produtores etc.). O que aconteceu? Por que o velho raciocínio é tão facilmente desmascarado por estes exemplos? Por não levar em consideração a complexidade e a riqueza das redes, das trocas, do incessante boca a boca de um meio para outro, as oportunidades de diversificar a oferta, o fato de que o ‘retorno econômico’ do autor possui diversos níveis, inclusive alguns (aparentemente) tortuosos.

É graças a uma inabilidade para compreender tal complexidade que o setor cultural (especialmente a indústria da música) perdeu anos e anos de inovações. Novas oportunidades que foram encaradas como ameaças ao invés de desafios, e reações histéricas que foram dirigidas ao Napster e a tudo o que se seguiu. Isto começou a mudar quando Steve Jobs mostrou que era possível, mas nesse meio tempo uma guerra foi travada contra exércitos de clientes em potencial, cuja confiança foi perdida para sempre.

Anti-marketing.


Qual a última coisa que alguém que faz e vende música deveria fazer? Certamente criminalizar o público, processando quem os ama. Valeu a pena? Em nossa opinião, não. ‘Direitos do autor’ (cuidado para não levar esta frase semifraudulenta a sério) tais como os conhecemos são um grande freio para o mercado.

Por outro lado, o copyleft (que não é um movimento ou ideologia, mas um termo que abriga uma série de práticas, cenários e licenças comerciais) encarna o que se precisa para reformar e adaptar as leis autorais ao ‘desenvolvimento sustentável’. A ‘pirataria’ é endêmica, inevitável, uma maré que sobe empurrada pelo vento da inovação tecnológica. Obviamente, os poderosos da indústria do entretenimento podem continuar fingindo que nada está acontecendo, como a Casa Branca negando o Greenhouse Effect, o aquecimento global e as mudanças climáticas. Nos dois casos, os que negarem a realidade só podem ser varridos para longe. Se você está determinado a não ratificar o Protocolo de Kyoto, determinado a não investir na renovação das fontes de energia, determinado a não resolver os problemas ambientais, cedo ou tarde um furacão Katrina vai bater à sua porta.





2. Censura e o nascimento do copyright: contra o liberal “mito das origens”


Agora, de volta ao início. Vamos listar os muito conhecidos e normalmente mencionados fatos. A história do copyright começa na Inglaterra do século 16. A difusão da imprensa, a possibilidade de distribuir muitas cópias do mesmo texto é excitante para quem quer que tenha algo a dizer, especialmente algo político. Há uma explosão de jornais e panfletos. A Coroa teme a difusão de idéias subversivas e passa a exercer controle sobre o que se imprime.

Em 1556 surge a Stationers’ Company ["Companhia dos Editores"], um grupo de profissionais que passa a deter com exclusividade o direito de copiar. A companhia possui o monopólio das tecnologias de impressão. Alguém que queira imprimir algo passa necessariamente por ela. Diferente do que ocorria até então, quando qualquer um podia imprimir para si cópias de livros ou peças sem que os autores se importassem, já que eles não detinham os direitos (eles não existiam). Importante era que as obras circulassem e sua fama crescesse, já que assim os autores chamariam a atenção de possíveis protetores (mecenas, corporações culturais etc.). A partir desse ponto só se imprimem obras que possuam autorização (na prática, o selo do censor do estado) e que estejam listadas no registro oficial – note o detalhe! – em nome de um editor. O editor se torna o dono da obra, com a conivência do estado.

A mitologia ‘liberal’ do copyright como um direito natural, nascido espontaneamente com o desenvolvimento e o dinamismo do mercado é…puro conto de fadas! As origens remotas do copyright se encontram na censura preventiva e na necessidade de restringir o acesso aos meios de produção cultural (restringir, portanto, a circulação de idéias). Um século e meio depois e a Coroa sofre ataques nunca vistos: a rebelião escocesa de 1638, a “Grande Representação” parlamentar de 1641, a deflagração da Guerra Civil um ano depois, a revolução de Cromwell e a decapitação do rei. No fim da década de 1650 o país retorna à monarquia, mas a situação permanece instável e finalmente o parlamento impõe à Coroa uma declaração de direitos. A partir disso a monarquia inglesa se torna constitucional.

É preciso listar tais eventos para que se entenda como as coisas dentro da monarquia sofreram mudanças ao longo de um século e meio, e como isto afetou o que se pensava sobre a censura preventiva e os próprios editores. Um grande ressentimento passou a ser direcionado a este grupo, tanto que afinal se decidiu pelo fim do monopólio de impressão.

Os editores são atingidos onde mais dói – o bolso – e reagem de acordo. Eles iniciam uma campanha para assegurar que a nova lei reconheça a legitimidade dos seus interesses e trabalhe em seu favor. Seu argumento é: o copyright pertence ao autor; o autor, no entanto, não possui máquinas de impressão; as máquinas pertencem aos editores; assim o autor necessita do editor. Como regular essa necessidade? Simples: o autor, interessado em que a obra seja publicada, cede os direitos ao editor por um determinado período. Na raiz, a situação permanece mais ou menos a mesma. Só muda a justificativa legal. A justificativa ideológica não se baseia mais em censura, mas na necessidade do mercado. Todos os mitos que daí derivam acerca dos direitos do autor se baseiam no lobby dos editores: autores são forçados a cederem seus direitos…mas isso é pro seu próprio bem. As consequências psicológicas são devastadoras, uma variação da ‘Síndrome de Estocolmo’ (quando o sequestrado se apaixona pelo sequestrador). De agora em diante, autores se mobilizarão em defesa de um status quo que consiste neles próprios esperarem ao pé da mesa pelas migalhas e por um tapinha na cabeça. Pá, pá! Au!

A lei é o famoso Estatuto de Anne, que passa a ter efeito a partir de 1710. Ela antecede todas as leis e acordos internacionais sobre copyright, desde a Convenção de Berna em 1971 até o Digital Millennium Copyright Act e o Decreto Urbani. É a primeira definição legal de copyright tal qual ainda o conhecemos hoje, ou o conhecíamos ontem. Porque hoje mesmo algumas pessoas começaram a ter dúvidas. Dúvidas que nascem do fato de que copiar algo está ao alcance de muito mais pessoas agora, talvez de todos. Um bom punhado de nós tem em casa aquela tecnologia que os editores um dia monopolizaram. Para copiar uma obra não é mais necessário dirigir-se a uma companhia profissional. O espólio dos editores tem sido minado pela revolução micro-eletrônica iniciada nos anos 70 com o advento da tecnologia digital, a ‘democratização’ do acesso à computação. Primeiro a fotocópia e a fita K7, depois o VHS e o sampler, então a gravadora de CD e o P2P, e finalmente os dispositivos de memória portáteis como o iPod…como alguém pode acreditar que a justificativa ideológica do copyright – aquela que inspirou o Estatuto de Anne – ainda é válida?

Está claro que as coisas precisam ser revistas; este processo mudou todo o modo de produção da indústria cultural! Novas definições dos direitos de quem cria, produz e distribui são necessárias. Se uma ‘obra intelectual’ pode chegar ao público sem a mediação de um editor, de uma gravadora, da televisão ou de um produtor, então estas pessoas precisam se perguntar o que fazer agora, chegar a uma solução, redefinir o papel social do seu trabalho. Lutar para manter um monopólio que não se sustenta mais com ameaças de prisão acaba levando a um beco sem saída. É como se comporta o Antigo Regime, é a autocracia czarista. Felizmente, algumas pessoas começaram a perceber isso.




3. Google Print e similares: a web, o gratuito e o ato de reconstruir


Numa biblioteca você tem acesso gratuito a um livro e numa livraria você o compra, mas não há conflito entre as duas opções: os países onde se vendem mais livros são também aqueles com mais pessoas nas bibliotecas. É natural: quanto mais um livro circula, mais ele é lido, maior seu impacto na literatura.

A palavra-chave é ‘biblioteca’. Ela representa uma longa história de liberdade de acesso, posta em questão apenas muito recentemente (uma batalha ainda em curso). Tanto faz falar em bibliotecas feitas de tijolos ou bits, são igualmente bibliotecas. Se, ao contrário, o download for pago, estamos falando de livrarias, simples assim. Dito isto: Seth Godin, um dos maiores pensadores do mercado, diz que se x pessoas compram um e-book, o mesmo livro disponível gratuitamente será baixado por quarenta vezes x pessoas. Inverter a equação pode ser muito útil: a cada quarenta pessoas que baixam um livro de graça há uma que o irá comprar. A soma destes ‘um a cada quarenta’ leitores é garantida. São eles que compram o livro primeiro, e que primeiro falam dele. Eles são as conexões, os ‘evangelistas’, as ‘matracas’. Cada passo deve ser dado com estas pessoas em mente. Esta é a tática de Godin: novas obras (eletrônicas ou de papel) são postas à venda. Mas antes de divulgar o release de uma nova obra, ele disponibiliza a obra anterior para download. É uma estratégia de lançamento formidável.

O download gratuito de um texto e sua visibilidade nas ferramentas de busca têm um fim comum, e confluem para o mesmo objetivo: restituir o acesso on-line de produtos culturais ao público, o que pode encorajar a venda de livros.

Editoras que se opõe ao Google Print são como aqueles estúdios de cinema que, vinte anos atrás, denunciaram os fabricantes de videocassetes e fitas K7 alegando que a cópia doméstica violava o copyright. O famoso caso “Universal x Betamax”. A Universal acabou perdendo na Suprema Corte norte-americana…para sorte dela. Nos anos seguintes, a indústria cinematográfica creditou seu lucro não às salas de cinema, mas ao home video. Sobreviveu a crises graças ao VHS primeiro, e depois ao DVD. A Universal teria fechado caso houvesse ganho aquele processo. Ela perdeu, e terminou salva.

Poderíamos mencionar também a batalha absurda das gravadoras contra a introdução das fitas K7 nos anos 70, um prelúdio da guerra contra o download, travada apesar do fato de que (como mostra o iTunes) a verdadeira questão é oferecer ao público um modo legal de acesso à fonte.

A presente batalha custeada pelas editoras é ela também uma missão suicida contra inovações potencialmente vantajosas. Para o seu próprio bem, elas devem perder. Caso ganhem, as editoras terão encontrado um péssimo jeito de entrar para a história.

quarta-feira, 3 de junho de 2009

LICENÇAS LIVRES parte 3




# noéspecial #

Licenças livres e a multiplicação do conhecimento - parte três

txt Tiago Jucá Oliveira

Capítulo 4 - Alguns Direitos Reservados (Creative Commons)


Lógica colaborativista, a inversão

A escuridão deixada pelo copyright colaborou para quase apagar a criatividade e do conhecimento, não fosse uma luz a brilhar no fim do túnel. Faltava algo a mais que uma mera desobediência civil. Isto é, agir por rebeldia ou inocência contra uma lei injusta e atrasada podia ser a solução para o público, porém deixava o autor em meio ao fogo cruzado, pois não via sua obra ser difundida e nem ganhava dinheiro com isso. Uma alternativa era necessário para o criador disponibilizar sua criação, com usos mais flexíveis para a reprodução e a adaptação. No lugar do direito de cópia exclusivo do autor, a cópia permirtida, segundo as permissões do mesmo. O inverso do copyright, assim dizendo. O conceito Copyleft, um trocadilho que brinca com as expressões "permitido copiar" e "esquerdo autoral", surgiu através de Richard Stalmann, no qual afirmava pelo avesso a lógica do copyright: "todos direitos invertidos".

Nos primórdios da computação era comum os desenvolvedores disponibilizarem os códigos junto com os programas visando facilitar o suporte aos usuários. Em 1952 foi lançado o primeiro computador científico comercializado pela IBM. Dentre os usuários surgiu uma comunidade chamada SHARE (Sigla que no inglês significa compartilhar) formada por voluntários que trocavam informações sobre defeitos e versões aprimoradas do sistema desenvolvidas pelos usuários utilizando o código fonte que originalmente vinha junto ao sistema da máquina. Durante as primeiras décadas software era desenvolvido basicamente por pesquisadores acadêmicos ou de empresas em colaboração nunca sendo realmente enxergado como um bem de valor.

No final da década de 70 quando as empresas começaram a impor restrições aos programadores através de leis de direito autoral. Essa mudança visava impedir o acesso da concorrência ao que estava sendo desenvolvido. Um divisor de águas nessa história foi a carta escrita em 1976 por Bill Gates dirigida aos primeiros usuários de PC onde denunciava o uso de softwares não autorizados que estavam sendo copiados irregularmente. Segundo Gates a consolidação desta prática iria desencorajar os programadores a investir tempo e dinheiro para criar software de qualidade. Para muitos estudiosos esta carta foi um marco tanto para a expansão do software proprietário quanto para o surgimento do movimento pelo software livre.

A luta pela popularização do software livre teve início em 1983 com a fundação da Free Software Foundation (FSF) liderada por Richard Stallman hacker do laboratório de Inteligência Artificial do MIT (Massachusetts Institute of Technology). A maioria dos pesquisadores estava ligado a projetos comerciais utilizando software proprietário, assim Stallman se via sem saída pois ou assinava um termo de confidencialidade e utilizava os novos computadores mas não poderia mais compartilhar seus desenvolvimentos ou desistia de trabalhar com informática.

A solução que encontrou foi desenvolver um sistema operacional com código aberto que permitisse o uso das máquinas sem precisar utilizar nenhum software proprietário. Stallman batizou o novo sistema de GNU. Para evitar que o sistema operacional se tornasse proprietário, Richard desenvolveu a GNU Public License (GPL) uma licença jurídica que permite a cópia, alteração e redistribuição do software licenciado. A GPL se tornou a licença de copyleft mais utilizada em todo o mundo. Em 1992, um finlandês chamado Linus Towards desenvolveu durante meses dos monótonos invernos do seu país um núcleo de sistema operacional batizado de Linux. Esse coração foi incorporado aos desenvolvimentos do projeto GNU e licenciado também em GPL tornando o GNU/Linux um sistema operacional livre funcionando corretamente. Através da internet esse conhecimento se espalhou pelo mundo criando novas ferramentas como o Kurumin no Brasil e o projeto Ubuntu na África do Sul.

"Em vez de simplesmente abrir mão dos direitos autorais, o que permitiria que empresas se apropriassem de um programa livre, modificando-o e redistribuindo-o de forma não livre, Stallman pensou num mecanismo de constrangimento que assegurasse a manutenção da liberdade que o programador havia dado ao programa", diz Pablo Ortellado. "O mecanismo pensado era reafirmar os direitos autorais abrindo mão da exclusividade de distribuição e alteração desde que o uso subsequente não restringisse aquelas liberdades. Em outras palavras, a pessoa que recebia um programa livre, recebia esse programa com a condição de que se o copiasse ou o aprimorasse, mantivesse as características livres que tinha recebido: o direito de rodar livremente, de modificar livremente e de copiar livremente. Com isso, os programas livres, frutos de esforços coletivos voluntários, ganhavam uma licença que garantia que mesmo que as empresas quisessem usá-los e distribui-los, o fizessem de forma a manter suas liberdades iniciais". Era o princípio do software livre.

Filho do o Copyleft, o Creative Commons também permite a livre reprodução e cópia. Porém a invenção de Lawrence Lessig, um dos mais ferozes críticos do copyright, tem uma combinação de direitos permitidos pelo autor que flexibilizam o uso de suas obras. Ao disponibilizar o conteúdo para cópia e reprodução, ele decide se pode ser usada para fins comerciais ou não, se pode ou não fazer uma obra derivada da original, assim como se esta só seja possível ser feita desde que utilize uma licença idêntica ou não, e lógico, tudo isso com o devido crédito ao autor original. A partir da combinação dessas escolhas - ou "alguns direitos reservados", o Creative Commons gera algumas possibilidades de comunicar a licença aplicada. Uma se faz por um código de sinais que driblam as barreiras lingüísticas entre os povos; outra traz uma breve explicação em diversas línguas do que pode e do que não se fazer com a obra; e uma outra, mais completa, com os detalhes jurídicos da licença. Essas formas de comunicar a vontade do autor eliminam a difícil, lenta e urocrática procura pelos direitos da obra, pois ela já está previamente autorizada pelo próprio autor. A pergunta que fica, e que a partir de agora definitivamente procuramos exemplificar casos, dentro do propósito desta reportagem desde a primeira parte, como as licenças livres como Creative Commons e Copyleft são importantes para a prática de um comércio justo?

Salve



Com o avanço tecnológico que facilita a cópia e reprodução, e com as obsoletas leis de direitos autorais, muitos artistas optaram por disponibilizar suas obras com alguma licença livre. Entre eles o coletivo italiano Wu Ming, espécie de porta voz do Copyleft. Um de seus romances, 54, mesmo disponível para download na internet, é um sucesso de vendas na Europa no velho formato impresso, traduzido para várias línguas, inclusive para o português. Q. O Caçador de Hereges, outro livro do coletivo, vendeu mais de 200 mil exemplares na Itália e a tradução inglesa atingiu o topo dos best-sellers do Reino Unido, mesmo estando de forma gratuita para ser baixado. No Brasil, os pernambucanos entenderam rápido e claramente o recado da antena fincada no mangue. Em poucos anos, músicos, comunicadores, iniciativa pública e coletivos secretos perceberam que o poder da internet é infinito. CDs de bandas como Eta Carinae e Mula Manca e a Fabulosa Figura e de compositores como China e Marcelo Campello vão as lojas e para a internet ao mesmo tempo, por vontade própria. Sites de jornalismo cultural tem todo conteúdo previamente liberados para ser reproduzido. Uma pasta zipada com os vocais e as bases, todas separadas umas das outras, depois de baixadas são incentivadas pelos próprios autores para um remix caseiro. Um coletivo que produz música para os outros ganharem dinheiro. A cidade de Olinda pode ter em breve o maior arquivo de cultura popular registrada em Creative Commons, a um clique de distância de qualquer pessoa conectada num computador.

O caso do Mombojó é o mais curioso. A banda recifense lançou seu primeiro CD - Nadadenovo - e ao mesmo tempo o deixou liberado para download no site do grupo. Os resultados são incríveis para uma banda que recém estreiava, sem tocar na programação das rádios nem se apresentar nos mais populares programas de televisão. Nadadenovo teve 20 mil exemplares encartados na revista Outracoisa, quase todos eles vendidos nas principais bancas do país. Shows nas maiores cidades brasileiras, participações em festivais e eventos importantes, contrato com a gravadora Trama e comunidade no orkut com mais de 17 mil membros são outras conseqüências positivas. Marcelo Machado, guitarrista do Mombojó, lembra que "nos shows todo mundo dizia 'eu tenho as músicas no computador, mas eu tenho o CD também'. E a gente chegou a tocar em alguns lugares porque os contratantes desses lugares ouviram a gente pela internet. Então se o cara de Florianópolis não tivesse ouvido a gente na internet, não teríamos ido tocar em Florianópolis na nossa primeira turnê. E lá vendemos alguns discos". De acordo com Machado, colocar as músicas na internet "ajudou a aumentar as pessoas que vão aos shows e que cantam as músicas. E quem vai aos shows e gosta, compra o CD. E a gente vendo o CD nos shows mais barato do que está nas lojas. Aí uma coisa acaba trazendo outra, e isso vai aumentando, pois na internet se propaga muito fácil. O segundo álbum da banda seguiu o mesmo caminho do anterior, e além de estar a venda nas lojas de músicas, tem o download liberado para quem quiser ouvir. Outro integrante do Mombojó, Marcelo Campello, não teve dúvidas ao licenciar em Creative Commons seu disco de carreira solo, pois tem certeza de que o disco cairia na internet "independente de minha vontade, prefiro então canalizar essa energia para a minha página - dessa forma tenho acesso às estatísticas e estabeleço um contato mais direto com as pessoas", define o músico.

As obras com licença aberta para modificações tem sido de grande serventia a demais artistas. Com essa possibilidade previamente autorizada, livros são traduzidos para outras línguas, contos literários viram filmes, poesias são musicadas, músicas ganham remix, fotos são editadas. Convidado para fazer a trilha sonora do filme Narradores de Javé, DJ Dolores, um dos pioneiros do Creative Commons no Brasil, preferiu apenas compor e deixou para outros músicos a missão de remixar a trilha inteira. "Eles fizeram o que quiseram, nego cortou coisa, acrescentou e tal. As pessoas mudaram o caminho inicial da música e viraram co-autores. O que acontece é que na prática eu fiz uma música e de repente me vi co-autor de três, a mesma música com três versões diferentes e eu dividindo as autorias. Muita gente vai preferir uma dessas três do que a minha original. É um jeito inteligente de você tratar isso". De acordo com Dolores, "se a gente for pensar ninguém é autor de porra nenhuma, todo mundo copia de todo mundo. Música é uma criação coletiva pela sua própria natureza". "Sanidade", faixa aberta de Dolores, participou de um concurso de remix da Crammed Discs, e ganhou dezenas de versões remixadas por DJs de diversas nacionalidades, muitos dos quais nem o conhecem pessoalmente. Dolores acredita que "quando você usa o CC e permite que as pessoas mexam na sua música, mais ou menos a sua revelia, isso dá possibilidade de sua música ser multiplicada várias vezes. Quem sabe se alguém que mexa na sua música não faça algo melhor que você fez e aquilo estoure e aconteça alguma coisa". Apesar de não ser um sucesso musical no Brasil, DJ Dolores já fez turnês de shows pela Europa, onde chegou livremente em formato mp3 para o público estrangeiro.

Comércio Justo

Um comércio paralelo, porém legal, começa a tomar forma. A permissão de uso da obra original e/ou recriada para fins comerciais é o grande gerador de matéria-prima para a construção de novas relações economômicas. Aquele camelô urbano que vende produtos piratas agora da vez para o vendedor legal perante a lei. Assim pensa Caio Mariano, membro do Coletivo Re:Combo. As criações artísticas do grupo chamaram a atenção de uma distribuidora de discos de São Paulo, que quis saber o que precisava para lançar um disco. Mariano esclareceu: "as músicas estão lá no site, estão todas autorizadas. Você chega lá, baixa, pega a licença, imprime e vai numa prensa de disco, manda prensar e vende". E se alguém lançar uma versão pirata do disco, não há problema. Inclusive está salvo de cometer qualquer crime.

O jornalismo é um dos setores que tem muito a progredir com as licenças livres. Revistas, sites, blogs e portais com conteúdo liberado são cada vez mais comuns. A princípio pensa-se que o veículo de comunicação apenas faz fluir suas reportagens para mais pessoas acessarem. Mas ao exigir, por exemplo, o compartilhamento da reprodução com base numa licença idêntica, somente reutiliza aqueles que também são livres. Assim, o conteúdo não corre o risco de ficar restrito mais adiante. O incentivo e estímulo à aplicação das licenças livres faz surgir um elemento antes inviável aos pequenos meios de comunicação: a cobertura a distância de fatos e eventos sem ser preciso enviar um correspondente. Cada meio torna-se uma potente sucursal de outros, e vice-versa, em rede. Para cobrir um festival de música como o Abril Pro Rock para o seu blog pessoal, sem sair de casa ou duma sala de redação, você pode contar com vídeos feitos e exibidos pelo site Recife Rock, a mais completa experiência de mapeamento musical com arquivos de áudio e vídeo de uma única cidade aqui no Brasil, e incrementar a reportagem com as fotografias e os programas sonoros produzidos pelo site CircuitoPE. Sem pedir autorização ou favor a ninguém, desde que respeite a prévia licença.

O DILÚVIO, através desta reportagem, conheceu mais do que o previsto no planejamento inicial. Diversas experiências em formato colaborativo brotam de norte a sul do país. Esta matéria se encerra aqui, mas o aprimoramento e maior alcance das licenças livres recém estão começando. Os casos que conhecemos mais de perto e detalhadamente poderiam ser, cada um deles, uma nova reportagem a ser publicada. Nos falta espaço porém nos sobra vontade de trazer a prática mais perto de você. As possibilidades são múltiplas no campo da ação. O fortalecimento de economias solidárias e conhecimento compartilhado a cada dia são mais objetivos fundamentais que vamos perseguir em busca do comércio justo entre as pessoas.

>>> Parte 1 <<<
>>> Parte 2 <<<

#ALGUNS DIREITOS RESERVADOS

Você pode:

  • Remixar — criar obras derivadas.

Sob as seguintes condições:

  • AtribuiçãoVocê deve creditar a obra da forma especificada pelo autor ou licenciante (mas não de maneira que sugira que estes concedem qualquer aval a você ou ao seu uso da obra).

  • Compartilhamento pela mesma licençaSe você alterar, transformar ou criar em cima desta obra, você poderá distribuir a obra resultante apenas sob a mesma licença, ou sob licença similar ou compatível.

Ficando claro que:

  • Renúncia — Qualquer das condições acima pode ser renunciada se você obtiver permissão do titular dos direitos autorais.
  • Domínio Público — Onde a obra ou qualquer de seus elementos estiver em domínio público sob o direito aplicável, esta condição não é, de maneira alguma, afetada pela licença.
  • Outros Direitos — Os seguintes direitos não são, de maneira alguma, afetados pela licença:
    • Limitações e exceções aos direitos autorais ou quaisquer usos livres aplicáveis;
    • Os direitos morais do autor;
    • Direitos que outras pessoas podem ter sobre a obra ou sobre a utilização da obra, tais como direitos de imagem ou privacidade.
  • Aviso — Para qualquer reutilização ou distribuição, você deve deixar claro a terceiros os termos da licença a que se encontra submetida esta obra. A melhor maneira de fazer isso é com um link para esta página.

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