#CADÊ MEU CHINELO?

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

[overmundo] SEIS PATAS DE ELEFANTE


:: txt :: Ney Hugo ::

A primeira vez que vi um show do Pata de Elefante foi na terrinha. Era a terceira edição do Festival Calango (Cuiabá 2005), porém a primeira vez que a cena da música independente autoral olhava pra cidade, centro geodésico da América do Sul, com respeito e admiração. A programação era bastante diversa, com uma parte dedicada ao instrumental, nos shows de Pata e Macaco Bong - que até então tinha um aninho de vida, era um quarteto e jamais havia saído do Mato Grosso. Eu, público da cena de Hell City, estudante, blogueiro e músico amador, assisti o show das duas bandas e fiquei impressionado com a maneira diferente de se fazer música que acabara de conhecer.

Um mês depois já fazia parte do Espaço Cubo - bando que estava colocando Cuiabá na rota nacional da circulação de cultura -, fazia meu primeiro show como músico profissional pelo Macaco Bong na primeira vez que a banda tocou fora do MT, e participava do surgimento do Fora do Eixo e Abrafin (Associação Brasileira dos Festivais Independentes, hoje transmutada na Rede Brasil de Festivais).

Nessa trajetória, como não poderia deixar de ser, levamos o Pata mais várias vezes a Cuiabá e nos encontramos enquanto banda outras várias nos mais diversos festivais, estados e regiões. Tivemos a honra de sermos convidados por eles para uma apresentação conjunta (os dois trios somados) em seu show no Rumos Itaú Cultural, iniciando o Patong, um projeto que será um dia retomado em algum lugar na história.



Hoje, não estando mais na ativa com o Macaco Bong, moro na terra natal do Pata, quintuplicando o grau de proximidade, seja assistindo shows, contratando shows, seja discutindo a nova música brasileira e o Movimento Social das Culturas, compartilhando uma gelada e botando tudo em prática no dia seguinte.

Hoje o Pata é um quarteto. Os outrora guitarristas/baixistas Gabriel Guedes e Daniel Mossmann hoje se jogam na liberdade harmônica de suas seis cordas, “livres” do baixo. Já os graves e grooves agora estão nas mãos de Edu Meirelles, acrescentando uma força e negritude até então inéditos na banda. A patada - que sempre pesou deliciosamente como um paquiderme no tórax e nos ouvidos - ficou ainda mais potente.

Misture a essa receita - que inclui o swing, força e regência de Gustavo Telles na batera - os teclados de Luciano Leães e o trombone de Júlio Rizzo. Esse é o novo disco formato sexteto do Pata, previsto para ser lançado em abril. Uma prévia da pérola foi apresentada ao público gaúcho na última quinta no Bar Ocidente (veja fotos). A opinião deste, que acompanha a banda há quase 10 anos como público, contratante, parceiro, companheiro de estrada, músico de um mesmo palco, e agora, conterrâneo é: Tri Afú! Segura e prensa, que a Pata de Elefante vai bater! E vai chapar!

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

[do além] COLESTEROL ESCANDALOSO


:: txt :: Marlon Brando ::

Semana passada, meu nome frequentou as redações de jornais, revistas e telejornais. A morte da atriz Maria Schneider foi o gatilho para que veículos do mundo inteiro abrissem largos espaços para relembrar o filme que coestrelamos juntos e que chocou o mundo na década de 70: O Último Tango em Paris (Le Brioche au Beurre).

Você sabe, o motivo que escandalizou as plateias foi a cena de penetração anal, onde meu personagem, Paul, sodomiza Jeannie, interpretada por Schneider, usando manteiga como lubrificante. Cena essa que, curiosamente, nem estava no roteiro, foi algo que improvisei, depois de muito laboratório, usando apenas alguns tabletes que roubei do couvert da refeição anterior à filmagem. Alguns sustentam que foi a partir dessa experiência que minha forma física descambou. Maria ficou marcada por esse filme, modéstia à parte. Nunca mais ela conseguiu se livrar desse personagem ou pedir uns pãezinhos de entrada nos restaurantes sem ficar constrangida.

Para vocês terem uma ideia das reações provocadas pelo filme, basta dizer que, na democrática Grã-Bretanha, lançado com o título de Buttered Bagel, censores reduziram a duração da cena em questão a ponto de quase extingui-la. Na Itália a coisa foi pior. O Último Tango em Paris (Biscottini al Burro) foi lançado em 1972, mas só chegou às telas italianas em dezembro de 1975. Uma semana depois da primeira exibição, a polícia confiscou todas as cópias e a Justiça abriu um processo contra o diretor, Bernardo Bertolucci, por obscenidade. Pela qual foi condenado a 4 meses de prisão, além de ter tido seus direitos civis e políticos cassados por 5 anos. Imagina se eu tivesse usado o resto do couvert. O filme só voltou a ser exibido lá para 1987.

No Brasil, por causa da ditadura, o filme só veio a público em 79. E mereceu até citação em uma música dos trapalhões http://tinyurl.com/29dmrl Não deixe de assistir o Didi pronunciando Maria "Xinaida". E no Chile, Pinochet o proibiu por 30 anos. Ele queria o monopólio da sacanagem.

O mais curioso de essa cena ter entrado para a história é que poucos lembram que, durante a penetração, as palavras do meu personagem não usaram lubrificante. Ofegante, Paul diz: "Vou falar-lhe de segredos de família, essa sagrada instituição que pretende incutir virtude em selvagens. Repita o que vou dizer: sagrada família, teto de bons cidadãos. Diga! As crianças são torturadas até mentirem. A vontade é esmagada pela repressão. A liberdade é assassinada pelo egoísmo. Família, porra de família!" Sinceramente, acho esse texto muito mais chocante do que o ato de untar a forma.

É estranho pensar que hoje, O Último Tango em Paris, se fosse relançado na versão integral, não desnatada, chocaria as plateias por outros motivos. A turma vigilante da vida saudável, tenho certeza, iria se escandalizar com a manteiga. Por que não usaram óleo de canola? - perguntariam. O debate fatalmente se deslocaria para o campo da reeducação alimentar e a necessidade urgente em diminuir o consumo de gordura saturada e trans. Alegando que filmes têm a responsabilidade de dar bons exemplos. Logo concluiriam que o final trágico do filme nada mais é que o resultado da pouca oxigenação no cérebro da personagem amanteigada, obviamente provocada pela obstrução de suas artérias. O que, em outras palavras, significa dizer que investigar as profundezas do coração, nos dias que correm, dá muito menos Ibope do que tratar dos níveis de colesterol.

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

[noécologia] PORTO ALEGRE RESISTE ÀS MOTO-SERRAS


Quase quatro décadas após gesto pioneiro, manifestantes voltam a subir em árvores, para que “desenvolvimento” não signifique alienação e aridez

:: txt :: Elenita Malta Pereira ::

As árvores de Porto Alegre andam tristes. Com o aumento da frota de automóveis e a obtenção de verbas federais, associada à Copa do Mundo de 2014, a prefeitura iniciou uma série de obras viárias: construção de passagens subterrâneas, duplicação e ampliação de avenidas. Por isso, centenas de árvores estão marcadas para morrer, em diferentes bairros. Algumas já começaram a ser cortadas, o que vem gerando intensos protestos de ecologistas, moradores e amantes das árvores em geral.

Na Praça Júlio Mesquita, em frente à Usina do Gasômetro, catorze tipuanas (Tipuana Tipu) sangraram pela ação de moto-serras de funcionários da Secretaria Municipal de Obras e Viação (Smov). O corte, que ocorreu sem qualquer aviso ou consulta popular, surpreendeu os moradores e quem passava pelo local na manhã de quarta-feira (06/02/2013). A justificativa da administração municipal foi que as árvores precisavam ser removidas para a duplicação da Avenida Edvaldo Pereira Paiva, uma das obras em andamento para a Copa do Mundo. Segundo a prefeitura, essas obras contribuirão para o desenvolvimento de Porto Alegre.

A operação teve licença ambiental liberada pela Secretaria Municipal do Meio Ambiente (Smam) e prevê compensação através do plantio de 400 novas mudas em outros pontos da cidade. Segundo a prefeitura, após a conclusão das obras viárias, será desenvolvido um projeto de arborização para a Edvaldo Pereira Paiva e toda a orla do Rio Guaíba será remodelada.


Subir nas árvores, ontem e hoje

118 árvores foram marcadas previamente para o corte com a letra “C”, porém, quando os funcionários cortavam a 14ª tipuana, por volta de 11h30 da manhã, ocorreu algo não planejado pela administração municipal: jovens subiram nas árvores para impedir a derrubada. E conseguiram, pelo menos temporariamente.

Nem os cortes de árvores, para abrir espaço a obras viárias, nem subir nas plantas para impedi-los, são novidades em Porto Alegre. Essa mesma estratégia foi utilizada, há 38 anos, por Carlos Alberto Dayrell, para evitar o corte de (também) tipuanas, que estariam atrapalhando a construção de um viaduto, na Avenida João Pessoa, no centro da cidade. Em 25/02/1975, cerca de 10h da manhã, a caminho de fazer sua matrícula na Escola de Engenharia da UFRGS, Dayrell percebeu que algumas pessoas apenas observavam o corte das árvores. Indignado, resolveu subir na 7ª tipuana a ser derrubada. Ele era sócio da Agapan (Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural, fundada em 1971). Em uma das reuniões da entidade, o ecologista José Lutzenberger conclamara os jovens a subirem nas árvores para defendê-las. Quando viu a derrubada, Dayrell não teve dúvidas: aproveitou a própria escada da Smov (utilizada para cortar os galhos) para subir na tipuana. O episódio teve repercussão nacional e deu visibilidade às causas ecológicas defendidas pela Agapan e por Lutzenberger.

Declarações infelizes

O interessante é que a condução de obras de mobilidade urbana não mudou muito em Porto Alegre, apesar dos dois episódios terem ocorrido em contextos bem distintos. Em ambos os casos, a população não foi consultada ou, pelo menos, avisada do corte das árvores. Embora tenham passado quase 40 anos daquele tempo, quando vivíamos uma ditadura militar, a filosofia que rege a administração municipal – e também a federal – permanece a mesma: a primazia do desenvolvimento econômico sobre a preservação da natureza. Os projetos não prevêem nem tentam contornar a presença de árvores – plantadas há décadas – que fazem parte do cotidiano dos moradores da cidade.

Para piorar a situação, o prefeito de Porto Alegre, José Fortunati, emitiu notas na imprensa gaúcha que acirraram ainda mais os ânimos dos movimentos sociais contra a atitude da prefeitura. Fortunati disse que “as pessoas não utilizam estas árvores no Gasômetro”, e que a o alargamento da avenida é necessário, porque “existe um gargalo no trânsito e o monóxido de carbono liberado no ar diariamente é muito grande”.

Essas declarações foram, no mínimo, contraditórias. Se o fluxo de veículos no local é intenso e libera alta concentração de gases poluentes, as árvores do Gasômetro são extremamente úteis. A afirmação de que não eram utilizadas gerou inúmeros comentários irônicos, charges e foto-montagens no Facebook. Centenas de pessoas manifestaram-se, indignadas com o que seria a “falta de uso”. Afinal moradores e turistas costumam frequentar o local em seus momentos de lazer. Muitas famílias e grupos de amigos tomam chimarrão, fazem piquenique e até churrasco, ou simplesmente ficam na sombra das tipuanas. Além disso, todos por ali respiravam o oxigênio produzido por aquelas árvores.

Por uma copa com copas

Movimentos sociais de diversas ONGs, coletivos e simpatizantes de causas ambientais organizaram, através das redes sociais, um manifesto para o dia seguinte ao dos cortes (07/02/2013), na frente da Usina do Gasômetro. Convocadas às pressas, cerca de 500 pessoas compareceram ao evento. O sentimento geral era de indignação e revolta, tanto pelo que consideravam crime ambiental, quanto pelas declarações do prefeito.

Para mostrar que a população utilizava as árvores, jovens e crianças realizaram acrobacias, pendurando-se em faixas de tecido amarradas numa velha tipuana que escapou da moto-serra.

Quando já havia um bom público no local, por volta das 18h30, os manifestantes começaram a colocar galhos e troncos das árvores cortadas no meio da avenida. Interrompendo o trânsito (a mobilidade urbana, que foi a causa da derrubada), queriam garantir visibilidade ao protesto, e também sensibilizar a população para a necessidade de preservar as árvores locais.

A rua ficou tomada pelos galhos das árvores e pelos manifestantes, que portavam banners relacionando a Copa do Mundo com o corte das copas das árvores.

Muitas pessoas comentaram, durante o manifesto, que um evento tão breve como a Copa do Mundo (em Porto Alegre, serão apenas quatro jogos) não poderia justificar a derrubada de árvores que deviam ter cerca de 50 anos. Moradores locais acreditam que as tipuanas tenham sido plantadas nas décadas de 1960-70 e que, mesmo sendo exóticas, tornavam a paisagem bela e agradável. Para essas pessoas, as árvores eram muito úteis.

Outro ponto comentado foi o plantio para compensar os cortes. Mesmo que o número de mudas (400) seja bem maior do que as árvores que a serem derrubadas (115), quem irá fiscalizar o crescimento e o regadio? Além disso, as mudas levarão décadas para ficar do mesmo tamanho das árvores cortadas, portanto a medida não seria satisfatória em termos de compensação ambiental.

Também chamou a atenção de muitos o fato de as árvores estarem literalmente sangrando. No local do corte, os troncos apresentavam uma espécie de goma ou resina vermelha. A substância vermelha é uma seiva da casca da tipuana, como se fosse um suor do caule. Ao entrar em contato com o ar, a seiva endurece e fica com aparência de uma cera de vela derretida. A visão da seiva endurecida conferiu maior dramaticidade ao protesto. Seres vivos, assim como nós, humanos, as tipuanas também sangram ao serem feridas.

Por volta das 20h, parte dos manifestantes continuou o protesto à frente da prefeitura municipal. Portando galhos das árvores cortadas, tal qual soldados o bosque de Birnam, em Macbeth, eles caminhavam sob o olhar curioso dos moradores do centro, e entoavam o lema da tarde “Queremos árvores!”. Felizmente, não houve confronto com a polícia, como no episódio de 1975, e no caso recente do Tatu-Bola, símbolo da Copa, cujo esvaziamento gerou violência por parte de alguns policiais.


Árvores, pessoas e desenvolvimento

Devido aos protestos, a prefeitura resolveu suspender temporariamente os cortes. De acordo com o secretário do meio-ambiente, Luiz Fernando Záchia, é quase impossível que sejam suspensos em definitivo. O próprio prefeito reconheceu que houve “problemas de comunicação” no episódio. No entanto, os ambientalistas seguirão lutando pela manutenção das árvores.

Esses acontecimentos em Porto Alegre indicam a necessidade de profundas reflexões. A primeira é sobre o modelo de desenvolvimento vigente no Brasil. A isenção de IPI, que incentivou a compra de milhões de carros em todo o país, aqueceu o consumo interno e beneficiou as grandes montadoras, mas trouxe sérios problemas estruturais às grandes cidades, com a necessidade de obras viárias capazes de suportar o aumento do fluxo. No entanto, para alargar avenidas e construir novos estacionamentos, não têm sido poupados parques, praças e árvores. O brasileiro realizou o sonho de comprar o carro, mas dirigir tornou-se um tormento, em meio a um tráfego que pode congestionar a qualquer horário do dia, não mais só na hora do rush. O motorista está mais estressado e o número de acidentes de trânsito só aumenta, ano a ano. A qualidade do ar piora, pois além de mais veículos, há menos árvores nas ruas. Será que podemos chamar isso de desenvolvimento?

Outra reflexão pertinente é sobre o valor da natureza para os humanos, um tema muito debatido em ética ambiental. Grosso modo, há duas correntes dominantes, uma antropocêntrica e outra biocêntrica. A primeira defende que a natureza só tem valor enquanto recurso, como fonte de riquezas ao homem, e por isso ele teria direito de explorá-la com a tecnociência. A segunda sustenta que a natureza tem valor intrínseco, como suporte para a vida no planeta, e que nenhum dos seres vivos é mais importante que os demais, nem mesmo o homem. Nosso modelo econômico e civilizatório optou pela primeira corrente, por isso a utilização maior da natureza tem sido para produzir capital.

A morte de árvores para dar lugar a automóveis demonstra que Porto Alegre, apesar da atuação do movimento ambientalista há mais de 40 anos, não avançou muito em termos de conscientização ecológica. Enquanto futebol, carros e estacionamentos forem mais importantes do que pessoas, árvores e animais, nossa sociedade não será desenvolvida. É por isso que subir nas árvores e lutar contra seu corte ainda é tão importante. Manifestações como as mencionadas neste artigo, além de lembrar a importância da natureza, são um alento em nosso mundo capitalista, onde todo produto é sinônimo de mercadoria. Infelizmente, para alguns, dinheiro não dá em árvore. Mas se o capitalismo se pretende tão selvagem, deveria começar pela preservação das árvores e dos animais, em nossas selvas de pedra…

sábado, 23 de fevereiro de 2013

[a vida como ela noé] JOÃO-ALGUÉM

:: txt :: Júlio Freitas ::

 Tem aquele cara que conheci, ele me pediu um cigarro; estávamos no inverno de 2011, naquela época eu estava desempregado e vivia perambulando por aí, gastando toda a grana da minha rescisão sem nenhuma preocupação na cabeça. Resolvi pagar-lhe algumas cervejas em troca de sua história , comprei-as num posto e no sentamos na calçada para conversar.

 João Batista é o seu nome, o mesmo de meu pai, vive na rua desde adolescente, cata garrafas e outras sucatas e também se maquia de palhaço, fazendo malabarismos afora, não sabe por onde anda sua família e tampouco deseja saber, na verdade a sua família são aqueles que moram na rua como ele; cria-se um vínculo muito forte com quem está na mesma situação e desta forma ele aprendeu tudo o que sabe sobre a vida, eu já passei por algumas dificuldades, mas nenhuma chega perto das que João me contou, e mesmo assim ele consegue sorrir de maneira límpida, até inocente. Entre um gole e outro pude notar sua grande facilidade com as palavras, certamente seria um ótimo escritor, senti-me vazio e mesquinho comparado à vida dele, que era cheia até a borda.

 Não sei porque somente agora fui escrever este pequeno relato, talvez precisasse esperar até que o acontecimento se internalizasse na minha mente, até que que suas palavras fossem por mim compreendidas por completo: "Cara, primeiramente tu deve se sentir muito grato por estar vivo, cercado de pessoas que te amam, neste mundo, neste aqui e agora. O resto fica em segundo plano."

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

[bolo'bolo] UMA GRANDE RESSACA



   Viver neste planeta não é tão agradável quanto poderia ser. É óbvio que alguma coisa não deu certo na espaçonave Terra, mas o quê? Talvez um equívoco fundamental quando a natureza (ou quem quer que tenha sido) resolveu pôr em prática a idéia "Ser Humano". Ora. Por que deveria esse animal andar sobre duas pernas e começar a pensar? Mas, enfim, quanto a isso não há muita escolha - temos que aprender a lidar com esse erro da natureza, isto é, nós mesmos. Erros existem para aprendermos com eles.

    Em tempos pré-históricos o negócio não parecia tão mau. Durante o Paleolítico, cinqüenta mil anos atrás, éramos muito poucos. Havia comida abundante (caça e vegetais), e sobreviver exigia só um tempinho de trabalho com esforços modestos. Catar raízes, castanhas ou amoras (não esquecer cogumelos) e matar (ou melhor, pegar na arapuca) coelhos, cangurus, peixes, pássaros ou gamos levava duas a três horas por dia. Repartíamos a carne e os vegetais com os outros e passávamos o resto do tempo dormindo, sonhando, tomando banho de mar e de cachoeira, fazendo amor ou contando histórias. Alguns de nós começaram a pintar as paredes das cavernas, a esculpir ossos e troncos, a inventar novas armadilhas e canções.

    Perambulávamos pelos campos em bandos de vinte e cinco, mais ou menos, com um mínimo de bagagem e pertences. Preferíamos climas suaves, como o da África, e não havia civilização para expulsar a gente em direção aos desertos, tundras e montanhas. 0 Paleolítico deve ter sido mesmo um bom negócio, a se acreditar nos recentes achados antropológicos. É por isso que ficamos nele por milhares de anos - um período longo e feliz, comparado com os dois séculos do atual pesadelo industrial.

    Aí alguém começou a brincar com plantas e sementes e inventou a agricultura. Parecia uma boa idéia: não tínhamos mais que andar procurando vegetais. Mas a vida ficou mais complicada e trabalhosa. Éramos obrigados a ficar no mesmo lugar por vários meses, a guardar sementes para o plantio seguinte, a planejar e executar o trabalho nos campos . E ainda precisávamos defender as roças dos nossos primos nômades, caçadores e coletores que insistiam em que tudo pertencia a todo mundo.

    Começaram os conflitos entre fazendeiros, caçadores e pastores. Foi preciso explicar aos outros que havíamos trabalhado para acumular nossas provisões, e eles nem tinham uma palavra para trabalho.

    0 planejamento, a reserva de comida, a defesa, as cercas, a necessidade de organização e autodisciplina abriram caminho para organismos sociais especializados como igrejas, comandos, exércitos. Criamos religiões com rituais de fertilidade para nos manter convictos da nossa nova escolha de vida. A tentação de voltar à liberdade de caçadores e coletores deve ter sido uma ameaça constante; e, fosse com patriarcado ou matriarcado, estávamos a caminho da instituição, família e propriedade.

    Com o crescimento das antigas civilizações na Mesopotâmia, índia, China e Egito, o equilíbrio entre os humanos e os recursos naturais estava definitivamente arruinado. Programou-se aí o futuro enguiço da espaçonave. Organismos, centralizadores desenvolveram sua própria dinâmica; tornamo-nos vítimas da nossa criação. Em vez de duas horas por dia, trabalhávamos dez ou mais nos campos ou nas construções dos faraós e césares. Morríamos nas guerras deles, éramos deportados como escravos quando eles resolviam, e quem tentasse voltar à liberdade anterior era torturado, mutilado, morto.

    Com o início da industrialização as coisas não melhoraram. Para esmagar as rebeliões na lavoura e a crescente independência dos artesãos nas cidades, introduziu-se o sistema de fábricas. Em vez de capatazes e chicotes, usavam máquinas. Elas comandavam nosso ritmo de ação, punindo automaticamente com acidentes, mantendo-nos sob controle em vastos galpões. Mais uma vez progresso significava trabalho e mais trabalho, em condições ainda mais assassinas. A sociedade inteira, em todo o planeta, estava voltada para uma enorme Máquina do Trabalho. E essa Máquina do Trabalho era ao mesmo tempo uma Máquina da Guerra para qualquer um - de dentro ou de fora - que ousasse se opor. A guerra se tornou industrial, como o trabalho; aliás, paz e trabalho nunca foram compatíveis. Não se pode aceitar a destruição pelo trabalho e evitar que a mesma máquina mate os outros; não se pode recusar a própria liberdade sem ameaçar a liberdade alheia. A Guerra se tornou tão absoluta quanto o Trabalho.

    A nova Máquina do Trabalho criou grandes Ilusões sobre um futuro melhor. Afinal, se o presente era tão miserável, o futuro só podia ser melhor. Até mesmo as organizações de trabalhadores se convenceram de que a industrialização estabeleceria bases para uma sociedade mais livre, com mais tempo disponível, mais prazeres. Utopistas, socialistas e comunistas acreditaram na indústria. Marx pensou que com essa ajuda os humanos poderiam caçar, fazer poesia, gozar a vida novamente. (Pra que tanta volta?) Lenin e Stalin, Castro e Mao e todos os outros pediram Mais Sacrifício para construir a nova sociedade. Mas mesmo o socialismo não passava de um novo truque da Máquina do Trabalho, estendendo seu poder às áreas onde o capital privado não chegaria. Á Máquina do Trabalho não importa ser manejada por multinacionais ou por burocracias de Estado, seu objetivo é sempre o mesmo: roubar nosso tempo para produzir aço.

    A Máquina do Trabalho e da Guerra arruinou definitivamente nossa espaçonave e seu futuro natural: os móveis (selvas, bosques, lagos, mares) estão em farrapos; nossos amiguinhos (baleias, tartarugas, tigres, águias) foram exterminados ou ameaçados; o ar (fumaça, chuva ácida, resíduos industriais) é fedorento e perdeu todo o sentido de equilíbrio; as reservas (combustíveis fósseis, carvão, metais) vão se esgotando; e está em preparo (holocausto nuclear) a completa autodestruição. Não somos capazes nem de alimentar todos os passageiros desta nave avariada. Ficamos tão nervosos e irritáveis que estamos prontos para os piores tipos de guerra: nacionalistas, raciais ou religiosas. Para muitos de nós, o holocausto nuclear não é mais uma ameaça, mas a bem-vinda libertação do medo, do tédio, da opressão e da escravidão.

    Três mil anos de civilização e duzentos de acelerado progresso industrial deixaram a gente com uma enorme ressaca. A tal da economia se tornou um objetivo em si mesma, e está quase nos engolindo. Este hotel aterroriza seus hóspedes. Mesmo a gente sendo hóspede e hoteleiro ao mesmo tempo.

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

[agência pirata] HOSPÍCIO É DEUS

:: txt :: Maura Lopes Cançado ::

Estou de novo aqui, e isto é — Por que não dizer? Dói. Será por isto que venho?

Estou no Hospício, deus. E hospício é este branco sem fim, onde nos arrancam o coração a cada instante, trazem-no de volta, e o recebemos; trémulo, exangue — e sempre outro. Hospício são as flores frias que se colam em nossas cabeças perdidas em escadarias de mármore antigo, subitamente futuro — como o que não se pode ainda compreender. São mãos longas levando-nos para não sei onde — paradas bruscas, corpos sacudidos se elevando incomensurá­veis: Hospício é não se sabe o quê, porque Hospício é deus.

Acho-me na Seção Tiüemont Fontes, Hospital Gustavo Riedel, Centro Psiquiátrico Nacional, Engenho de Dentro, Rio. Vim sozinha. O que me trouxe foi a necessidade de fugir para algum lugar, aparentemente fora do mundo. (Ou de —————— Era tão grave. Proteção? Mas aqui, onde não me parecem querer bem e sofri tanto?) ("Não me querer bem" talvez seja mi­nha maneira única de ser amada.) Havia lá fora grande incompreensão. Sobretudo pareceu-me estar sozinha. Isto faria rir a muitas pessoas: eu trabalhava no Suplemento Literário do Jornal do Brasil, onde me cercavam de grande atenção e muito carinho. Reynaldo Jardim é o diretor e me queria bem deveras. Ó, o zelo de todos. O zelo de Reynaldo. Naturalmente, penso, por eu haver antes estado aqui, saindo para trabalhar lá. A curiosidade em torno de mim: " — Esta é Maura Lopes Cançado, a que escreveu No quadrado de Joanna? — O conto é realmente bom, mas pensar que a personagem dele é louca catatônica pas­sou a aborrecer-me (como as pessoas são estúpidas, ainda se pretendem ser gentis). Minha posição me marginalizava. As coisas simples não se ajustavam a nada em que eu pudesse tocar, sen­tir. Era a impressão.

Quanto tempo trabalhei no jornal? Reynaldo Jardim, Fer­reira Gullar, Assis Brasil, e tantos outros, meus protetores. Quase todos os bons intelectuais da nova geração. E de rir. Protetores no bom sentido, como diriam. Mas que bom sentido, se me fizerem sofrer tanto? Por que, como chegar a eles, sem desespe­ro? — E que ignoram o quanto me custa uma palavra simples, como fui sozinha desde a infância. E de amá-los — demais e inútil — passei a odiá-los: por não me compreenderem. Não saberão jamais o quanto podem fazer sofrer uma criatura tímida e necessitada como eu: porque sinto vergonha. Gullar pareceu can­sado de mim. Ainda vendo-o imoto e inacessível não consegui desprezá-lo. Minha necessidade de afirmação deixava-me agressiva, movia-me pela redação do jornal o dia todo sem sorrir. Minha timidez. Enquanto meu ser se enrijecia, voltava-me para mim mesma à espera de um milagre que me projetasse, os ou­tros me olhando atónitos (é ainda mais do que No quadrado de Joanna, é ainda mais). Nada acontecia a não ser eu, me repetindo dia a dia. Minha ignorância.

Destruí tudo agredindo Reynaldo Jardim. Foi uma briga feia. Briguei sozinha. Ele não ousaria ferir-me, pois tem sua própria maneira de demonstrar amor. Consegui escandalizar Carlos Heitor Cony, que já foi quase padre, é facilmente escandalizável. Além de julgar estar ferindo Reynaldo, ao falar coisas inverossímeis e degradantes a meu respeito. Algo em que pensar: se tem alguma afetividade por mim deve ter sofrido. Como me destruí.

Falei de mim tantas vilezas (já fiz isto com mamãe. Estou muito cansada). Telefonei antes de vir a dona Dalmatie, enfermeira minha amiga. Levou-me a doutor J., pedi-lhe que me aceitasse no hospital:

- Por favor, doutor J., não sei que fazer lá fora. Estou des­truída. Aceite-me no hospital. Briguei no jornal. Ele (surpreendente) pareceu compreender. Dona Dalmatie não estava de acordo:

- Tenho um sítio sossegado. Passe uns dias lá. Quanto ao emprego, daremos um jeito. Você tem péssima memória, hein, Maura? Não me conformo em vê-la de novo aqui.

- Tenho boa memória, sei o que me espera. Mas vim dis­posta a ficar. A senhora não pode entender. Lembra-se de que me disse outro dia que não saí daqui recuperada? Está tudo difícil.

Fomos as duas ao IP (Instituto de Psiquiatria), onde se fa­zem internações. Ela, de lá, foi para casa. Voltei sozinha para este hospital. Doutor J. já não estava mais. Mandaram-me para a Seção Cunha Lopes (não pertence a doutor J.) A guarda que me recebeu (monstro antediluviano), Cajé, me fez imediatamen­te trocar o vestido pelo uniforme do hospital. Enquanto trocava de roupa, recebia dela as intimidações:

- Não banque a sabida nem valentona. Pensa que por ser bonita vale mais do que as outras? Saiba lidar conosco (guardas), que se dará bem. Queixas ao médico não adiantam. Vocês são doentes mesmo. Compreendeu?" Claro que compreendi, Cajé. Estou aprendendo há três anos.
Depois do jantar deram-me um quarto e dormi sozinha até o dia seguinte. Estava exausta. De manhã chovia. Puseram-me no pátio junto com as outras, percebi que nenhuma funcionária se dirigia a mim. Ah, não: dona Aída se dirigiu, dando-me um empurrão, à hora do café: " — Entre na fila. Que está esperando? Quer que te demos café na boca?". Entrei na tal fila, ainda muito cansada para revidar a agressão (das outras vezes em que estive aqui esta fila não existia). Depois do café fui para o pátio. Ou, fui mandada para o pátio. Ainda chovia muito. Parecia-me um sonho: àquelas mu­lheres encolhidas de frio, descalças, fantásticas. Eu nem sequer pensava. Via, como se nada em mim fosse mais que os olhos, recomeçando num pesadelo (voltei, meu deus, voltei). Durante o almoço veio chamar-me uma guarda:

— O Diretor quer falar-lhe". Devia ficar estupefata (por motivos óbvios), mas nem ao menos fiquei surpresa. Se ameaçassem tirar-me os olhos, não encontrariam em mim qualquer reação. E as coisas pareciam caminhar inexoráveis.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

[noéditorial] O FASCISMO CUBANO E SEUS PUXA SACOS NA BAHIA




::opn::Tiago Jucá Oliveira::

Feira de Santana, 18 de fevereiro de 2013.

Um bando de primitivos, que se dizem a favor da democracia, impediram que um documentário sobre a dictadura cubana dos tiranos Castro fosse exibido. No filme havia depoimentos de várias pessoas contrárias e/ou vítimas do regime fascista de Cuba, entre elas Yoani Sánchez, que há seis anos está impedida de sair da ilha (ou prisão) caribenha, mas que após muita luta e pressão externa conseguiu a liberação. Ela estava em Feira de Santana na sessão que foi cancelada pelos nazicomunistas democráticos.

Não tenho mais nada a comentar. Só relatar os verdadeiros factos é o suficiente pra saber de que lado estou. E que sempre estarei: da liberdade de expressão, de opinião, de imprensa, de informação, de comunicação. E isso não há em Cuba. E nem é o que aqueles imbecis que não deixaram o filme passar querem. Eles querem a censura e o pensamento único. Quem não concorda, lá, sofre severas punições e é acusado de 'espiã americana'. Aqui, logo a rotularam de 'agente do imperialismo'.

Se se dizem democráticos, por que não largam o poder em cuba e deixam o povo opinar? Se defendem a democracia, por que esses idiotas lá na Bahia não deixam o documentário passar e, inclusive, o assistem pra saber o que realmente se passa naquela ilha, mas que a imprensa oficial e única de lá não mostra.

Logo logo vai aparecer outro mentecapto pra cagar pela boca. Não perca seu tempo, aqui não é pinico. Mas caso queira falar merda, não se preocupe, não vou lhe mandar pro paredão. Hipócritas!

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

[...] ROAD

:: psy :: Taís de Araújo Pereira ::

Sabes que estará aqui
E eu sei que estará aí também
E que mal tem
Meu bem
Em saber que somos pedaços
Ossos constritados
Entre amores
De tempos passados
Cinza e pó
Semente ainda por germinar
Não me interprete mal
Meu coração também aperta
Quando imagino os rostos
Orgasmos e casos
Que o teu corpo absorveu
Antes do meu
Porém
Sabes bem
Sem todas essas experiências
Seríamos nada mais do que iniciantes
Amantes
Semblantes em branco
Esperando o momento
De errar de forma amadora
Amando
Aquilo que não nos satisfaz.

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

[nem te conto] DEPENDENTE QUÍMICO DE BUCETAS

:: txt :: Pablo Treuffar ::

 Não é fácil falar com mulheres
Sensibilidades complexas e obtusas
Mentes
Não quero muito
Contento única mulher por estação
Destrinchá-la ao bel prazer
No máximo duas simultaneamente
Mulheres competindo transam melhor
Uns são viciados em cocaína
Outros em bebidas
Outros ainda em jogos
Eu sou compulsivo por mulheres
Doloroso deixar de foder algumas
Sou dependente químico de bucetas
Observo
Humanos inabilitados em transpor o alvéolo moral
Farsas
Lhufas sexuais
Encarcerados em si
Sou pessimista
Acredito no ser humano traindo com a melhor amiga
Com a vizinha
Com a prima
Com a porra toda
Acredito na maldade humana
Acredito em foder a outra
Fazer o mal
Ser filho da puta por frustrações reprimidas
Não acredito ao contrário
No máximo sendo bem enganados
Consideram-me um comedor
Porra nenhuma!
Trepo com o encéfalo
Migalhas masturbatórias

sábado, 9 de fevereiro de 2013

[agência pirata] A QUEM INTERESSAR POSSA

:: txt :: Wladymir Ungaretti ::


A estas alturas da vida não há, da minha parte, nenhuma dificuldade em conviver com a crítica. Tenho uma história. Assim como exerço este direito que, deveria ser uma saudável prática de todos, em especial por nós jornalistas, com o máximo de contundência, respeitosa. Não tenho nenhuma dificuldade de conviver com “este ambiente crítico”, até mesmo com as posições radicalmente opostas às minhas. Reacionários inteligentes quase sempre nos propõem questões interessantes. É raro. Mas não estou disposto a conviver com “amigos”, nos espaços virtuais, cujo “furor crítico” mascara radicais diferenças políticas, ideológicas e profissionais, mas que ficam diluídas na “amizade virtual”. E que se manifestam quando, aparentemente, é possível o “amigo” levar alguma “vantagem” na desqualificação do que escrevemos. Em cima de recentes episódios, alguns “amigos” que nunca “curtiram” ou acrescentaram uma única linha, crítica ou de apoio, às minhas escrituras, todos conhecedores do meu trabalho, tanto nos espaços virtuais (em 12 anos de atividade) como em sala de aula (outros 20 anos), se sentiram bem à vontade para desqualificarem o meu trabalho. Não perderam tempo.Trocaram, rapidamente, a crítica fraterna ou a sinalização de que eu poderia estar cometendo um erro, por dizerem que o que faço é o mesmo que o showrnalismo praticado pela mídia corporativa, a que tanto crítico. Deixei passar uns dias para refletir. E, agora, escrevo este texto para comunicar que estarei retirando estas pessoas da minha lista de amigos, gradativamente. Tenho exatos 44 anos de exercício do jornalismo, 20 como professor de jornalismo da UFRGS, uns 50 de militância política, quase dois de cadeia na década de 70 e nunca tive a pretensão de ser o dono da verdade, nem mesmo na minha juventude de militância stalinista. Estou ficando um velho chato e “intransigente” com o desrespeito. Sou filho de um operário metalúrgico e de um mãe costureira. Sou um professor da UFRGS por um descuido do sistema. Um privilegiado. Certamente cometi muitos erros na vida e pretendo continuar arriscando. Sou do tempo de uma “religiosidade” que exigia que filho de comunista fosse o melhor em tudo, intransigentemente; honesto em todos os sentidos. Defensor dos todos os que estivessem à margem. É papo reto.

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

[...] ANONIMATO



As autoridades temem as máscaras por atrapalharem seu poder de identificar, rotular e catalogar: saber quem você é... Nossas máscaras não servem para esconder ou ocultar a nossa identidade, mas para revelá-la... Hoje nós devemos dar um rosto a essa resistência; colocando nossas máscaras demonstramos a nossa união; levantando as nossas vozes nas ruas nós descarregamos toda a raiva contra os poderosos sem rosto...

Mensagem impressa dentro das máscaras distribuídas no Carnaval Anticapitalista de 1999 que destruiu o distrito financeiro central de Londres.

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

[...] MEU FOGO


:: psy :: Júlio Freitas ::

Não me procure 
não estou 

sou verso perdido 
na poeira da estrada 
incomodando 
entrando em teus olhos 
lacrimejando 

Não me procure 
não estou 

sou bêbado tropeçando 
vomitando em teu pés 
ferro em brasa na tua língua 
poeta vadio da ralé.

domingo, 3 de fevereiro de 2013

[nem te conto] NA DISNEYLÂNDIA DOS NEO-PÓS-PROTO-HIPPIES



:: txt :: Macedusss :: 

  Algumas semanas antes do início do F$M, eu já começava a lentamente me coçar em relação ao mesmo. Claro que sem me movimentar muito, afinal de contas os pagos gaúchos com o sol de janeiro ficam algo realmente insuportável, e cada gaúcho sabe dar a verdadeira importância para sua casa, para uma sombra, uma cerveja nevando e um bom ventilador. Depois de enviar uns dois ou três e-mails, já estava com a minha credencial de imprensa garantida. E como uma coisinha destas sabe facilitar a nossa vida. Entrada facilitada em quase todos os picos do Fórum. Acesso à sala de imprensa, com internet, lanchezinho e essas coisinhas frescas de jornalistas. Claro que o que mais me emocionava nesse pedacinho de cartolina vermelha com meu nome era a possibilidade de fazer algum grau com as meninas na hora do xaveco.

  Dois dias antes de começar o evento, rumei a Porto Alegre para retirar a minha credencial e a programação completa de todos os eventos e atividades. Sol a pino. Pele grudando de tanto protetor solar. Sem problema algum retirei tudo que precisava na sala de atendimento a imprensa. Eu era a partir de agora um representante da imprensa no Fórum $ocial Mundial. Oh! A mídia anda realmente mal das pernas. As possibilidades estão por ai.

  O calor pedia uma cervejada, só me restava cumprir; acabei parando em um boteco de quinta categoria próximo ao Acampamento da Juventude. Deu pra chapar e também acordar com uma ressaca do cão. E o Fórum ainda não tinha nem começado. Puta la mierda. Dia 26, quarta-feira, início oficial do F$M. Inicio oficial de minha beberagem no Acampamento da Juventude. Cachaça, confusão e poucas horas de sono, esse seria daqui para a diante o meu roteiro pelos dias de fanfarra politiqueira da pseudo-esquerda, e de centenas e centenas de hippies fedorentos.

  Encurtando a conversa, não vou ficar aqui fazendo papel de babaca contando dia-após-dia de inutilidade de minha pessoa maceduniana pelo Fórum. Comecei tentando, entretanto desisti. Cumpre lembrar, minhas atividades intelectuais e conspiratórias se resumiram ao Acampamento da Juventude. Minha tarefa era participar junto de um grupo de colegas da faculdade na gravação de um documentário sobre o F$M. Beleza pura. O único problema era que se tratava de um projeto de criação coletiva. Ou seja, algo pequeno demais para o meu ego intelectualmente criativo e artístico. Eu, a ultra-vanguarda, sendo castrado por anseios enrustidos de comunismo coletivista. Nem fudendo! Mas fui igual, claro que encarando como um “empreguinho” de jornalista mixuruca. Queria ter a experiência de ter que trabalhar com uma pauta e essas coisas de redações fefelechentas. Resultado: filmei quase nada, não participei de porra de reunião alguma, não dei idéia alguma para o bando do grupo. Mas tava lá, como se fosse alguém muito importante para o projeto. Resultado: me senti como um jornalista profissional e mantive meu deboche muito-bem-obrigado-babaca.

  O que levo como resultado do F$M é que depois de muito trago e inconseqüência na cabeça, acabei nem me utilizando das possibilidades que uma credencial de imprensa podia ter me proporcionado. Não quero participar de marcha de pelado, quero manter meu direito de andar vestido. Quero manter meu direito de poder ir ao F$M para encher a cara e ficar vagabundeando. Não voto no PT e nem sou babaca o suficiente para acreditar que Hugo Chavez faça um governo de esquerda. Aliás, teve gente que brada de oposição de esquerda ao governo Lula e acredita que o mesmo quer destruir o país. Macacos me mastiguem e me cuspam na cara do homem que tem nome de mulher. Ingenuidade? Não. Demagogia pura. Também não acredito na oposição da democracia burguesa. Fórum $ocial Mundial? Piada. E em tempo de circo, quero me manter de cara cheia e alucinado.

  Para salvar os momentos de tédio e tortura intelectual, dia 29 de janeiro, em plena área central do Acampamento da Juventude do 5° F$M, participei de um delicioso evento em homenagem a todo o povo fedido das barracas, que quer mudar o mundo a base de sexo e maconha. Um recadinho para a hippaiada homenageada: banho não faz mal a ninguém. Trata-se de nada-mais nada-menos do que um show especial dos catarinenses afrescalhados da banda Os Legais, lado-a-lado dos gaúchos mirabolantes da Macedusss & Os Desajustados Band. As músicas soavam como temas de novela, o público interagia contagiadamente atirando tudo que era tipo de tralha nos membros das bandas. O ponto forte da festa foi a música “Eu tomo banho e me sinto um verdadeiro revolucionário quando ando acompanhado por 123 mil hippies fedidos e relaxados”, tocada com muito esplendor pela minha própria banda, a Macedusss & Os Desajustados Band, que contava com a participação de membros ilustres do grupo Bleff. Para evitar tumultos maiores e dada a minha sagaz esperteza, deixamos para que Os Legais subissem ao precário e improvisado palco por último. 

  Enquanto os catarinecas comandados por Gustavo Ghewer engatavam sua primeira música, esse ilustre que vós escreve já bebia uma cerveja morna a quarteirões de distância. O que sei é que os queridos e bem pensados elogios aos hippies continuavam, e o tempo fechou rapidamente. Boatos de confronto físico existem. Não tenho muita fé, mas também não duvido de nada. E o 5° F$M, como terminou? Ainda não tive coragem de ler nenhum jornal para saber acerca disso. O que sei que também não os levo a sério. E sobre mudar o mundo? Nem creio nisso.


Dannius Macedusss: entre outras tantas atividades ligadas ao underground, é membro e líder da banda nerde de blues/punx Macedusss & Os Desajustados Band e foi (ou tentou ser) testemunha ocular das diversas doideiras que rolaram durante cinco dias no Acampamento Intercontinental da Juventude, no 5° Fórum Social Mundial em Porto Alegre, janeiro de 2005.

sábado, 2 de fevereiro de 2013

[agência pirata] O PODER SUBVERSIVO DAS FALSAS AMEAÇAS

:: txt :: Fausto Erjili ::

Podemos potencializar nossos atos através de uma intensa guerrilha de desinformação. Espalhar falsos temores, passando uma idéia de que somos maiores do que realmente somos. 

Nesta época pós 11 de Setembro o poder monopolizou o medo da violência para seus próprios intentos. Se esse medo não fosse eficaz, eles não fariam isso. Podemos retomar essa arma pra nossos próprios interesses. 

Vou ilustrar com um exemplo. Escolhemos um shopping, ou até mesmo vários shoppings da mesmo cidade e sem sermos vistos pela segurança, espalhamos panfletos em determinados lugares estratégicos, como nos banheiros, envelopes esquecidos nas mesas das praças de alimentação, entre discos, em meio a livros, nos bolsos das calças, dentro dos sapatos e etc, ameaçando intensos ataques ao local, insinuando que aquela segurança privada está com os dias contados. 

Uma idéia é escrever nos panfletos que todos os freqüentadores que usarem o estacionamento do shopping terão as placas dos carros anotados, endereços residenciais rastreados e sofrerão intensas represálias. 

A operação pode ser incrementada com ligações anônimas com ameaças à bomba, avisos de seqüestros eminentes ou de que o local será vítima de ataques com gazes químicos tóxicos de fabricação caseira. 

Por fim, membros do grupo usando máscaras, instala na frente do shopping uma enorme faixa negra com os seguintes dizeres: 

SHOPPING CENTERS, MUITO EM BREVE: RUÍNAS PITORESCAS. 

Mas os shoppings são apenas os alvos mais óbvios, a campanha de desinformação deve se estender a todos os tentáculos deste Enorme & Assustador Monstro Chamado Capital. E não se enganem, estes mesmo tentáculos se encontram até em lugares considerados tabus para o ativismo, como escolas, hospitais, instituições sociais e partidos políticos. 

Instituições de ajuda social são muito mais danosas que esmolas, são válvulas de alívio de pressão que perpetuam a ordem muito mais eficientemente do que instituições de cunho explicitamente conservador, pois elas mantém ocupadas e iludidas as pessoas que seriam mais valiosas aos movimentos de resistência. 

FALSOS CARIDOSOS, MUITO EM BREVE: CARNE DE SEGUNDA. 

A cultura também é um dos venenos mais letais a nossa verdadeira Espontaneidade & Criatividade. Não é à toa que querem nos vendê-la, afinal de contas, trata-se da mercadoria que nos obriga a comprar todas as outras. Não se engane com as benesses prometidas pela tradição cultural, essa tal cultura não está aó para outra coisa além de perpetuar o estado das coisas com ares de legitimidade. Muito mais que Padres & Burocratas, estes cachorros mortos jogados na sarjeta, é a elite cultural o Grande Verme. 

ELITE CULTURAL, MUITO EM BREVE: ESCÓRIA MENDICANTE. 

A tão escorraçada, de nossa parte, burguesia, não passa de uma classe digna de pena. Após ter cumprido seu papel na história, agora ela não passa de um símbolo de ostentação, afundada até o pescoó em uma vida de plástico e de ilusão, consumidora de anti-depressivos e gastando boa parte de seu dinheiro e de sua preocupação, em se proteger e aumentar ainda mais, as grade da prisão que construiu pra si própria. 

BURGUESIA ESNOBE, MUITO EM BREVE: MOTIVO DE NOSSA PIEDADE. 



*NOTA DO EDITOR: RENAN CALHEIROS QUE VÁ À MERDA. ELEITO COM 56 VOTOS. EU NÃO VOTEI EM MERDA ALGUMA.

#ALGUNS DIREITOS RESERVADOS

Você pode:

  • Remixar — criar obras derivadas.

Sob as seguintes condições:

  • AtribuiçãoVocê deve creditar a obra da forma especificada pelo autor ou licenciante (mas não de maneira que sugira que estes concedem qualquer aval a você ou ao seu uso da obra).

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Ficando claro que:

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