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quinta-feira, 26 de agosto de 2010

LUÍSA MAITA

::txt::Leandro Gomes::

A inspiração de Luísa Maita alimenta-se da tradição musical brasileira na mesma intensidade com que frequenta a prateleria do pop americano. Para Luísa, não há diferença sensível entre João Gilberto e Michael Jackson, Nana Caymmi e Beyoncé, funk carioca e R&B como mostra este “Lero-Lero”, primeiro álbum da cantora e compositora paulistana lançado no Brasil pelo selo Oi Música.

A busca pela origem de suas influências nos conduz ao Bexiga, zona central da cidade de São Paulo. Ali naquele bairro de imigrantes italianos nasceu a menina cujo nome foi sampleado de uma canção de Tom Jobim: "Ana Luísa". Sua filiação revela a escolha: o pai, Amado Maita, descendente de árabes, índios, espanhóis e da bateria da Vai-Vai, dono de um estacionamento na Rua Santo Antonio onde costumava manobrar canções que resultaram, entre outras coisas, em um álbum lançado em 1971 e hoje disputado por colecionadores. A mãe, Myriam Taubkin, produtora cultural de herança judaica que desenvolve projetos importantes de preservação da memória da música brasileira. Ainda no eixo materno, os tios Daniel e Benjamim Taubkin exerceram forte influência sobre Luísa. O primeiro, segundo a própria, “tem um estilo que é um modelo pra mim, pois sua música é uma mistura de muitas influências diferentes”. O segundo, além do permanente aconselhamento musical e artístico, apresentou a sobrinha à filosofia oriental. “Isso foi muito importante. Hoje acredito no auto-conhecimento como um guia para a vida”.

Este pequeno passeio pela história de Luísa Maita nos leva também a um sítio no Grajaú, zona sul de São Paulo, para onde a família se mudou. Até os 11 anos, Luísa teve muito contato com a cultura da periferia da cidade e com os amigos músicos de seu pai que frequentavam o lugar, entre eles Sizão Machado, Lea Freire, Guilherme Vergueiro, Pete Wooley, Mozar Terra, Fernando Falcão. “Era um universo de música, de criação, com pessoas de muita personalidade”.

Como compositora Luísa Maita faz uso de temas recorrentes - e inabálaveis - da canção brasileira: o amor, a esperança, o sonho e a luta por uma vida melhor. Uma cronista que não só observa, mas participa da cidade, caminha pelas avenidas e vielas do centro e da periferia à procura de estalos poéticos e melódicos. Essa facilidade com o trato da canção foi identificada pela cantora Virgínia Rosa quando decidiu gravar dois sambas de Luísa - “Madrugada” e “Amado Samba” - e por Mariana Aydar que incluiu em seu segundo álbum a canção “Beleza” (uma parceria com Rodrigo Campos), eleita uma das melhores músicas de 2009 pela revista Rolling Stone Brasil.

Como cantora, Luísa usa sua sensualidade de forma sutil como forma de transmitir sensações, como instrumento de comunicação. Parece mesmo ter encontrado a medida certa para, em suas próprias palavras, “atingir o máximo de expressão com o mínimo de afetação”. Essa característica pode ser verificada (ainda que de maneira mais tímida) em algumas faixas do álbum de seu primeiro grupo, a Urbanda. A personalidade musical de Luísa ganha mais força nas participações que fez no disco “São Mateus Não É Um Lugar Assim Tão Longe” de Rodrigo Campos e “Alborada do Brasil” de Carlos Nuñez e também em sua interpretação para os vídeos da candidatura do Rio de Janeiro para as Olimpíadas de 2016 dirigidos por Fernando Meirelles.

Mas em nenhum desses trabalhos Luísa se revela como neste “Lero-Lero” que sintetiza compositora e intérprete, une referências musicais e pessoais com preciosismo e despojamento. Síntese cujas medidas foram assimiladas por Paulo Lepetit, o alfaiate produtor do álbum, que lhe conferiu uma vibração contemporânea através dos beats e programações eletrônicas e por Rodrigo Campos (co-produtor ao lado de Luísa) e seu violão afro que dialoga no mesmo volume com a base ritmica das canções.

O álbum é pontuado por influências da música pop e eletrônica indissociáveis da base acústica profundamente enraizada no samba, na bossa nova e na música popular brasileira. As faixas apresentam uma galeria de ritmos tradicionais do Brasil: do samba ao maculelê, da bossa nova ao baião. No entanto, aparecem desconstruídos, muitas vezes reduzidos às células rítmicas básicas que se transformam com os timbres eletrônicos dos beats e com a instrumentação acústica.

Além de Paulo Lepetit (baixo e programação eletrônica) e Rodrigo Campos (violão, cavaquinho, repique de mão, tamborim e surdo), o disco conta com a participação dos músicos Kuki Storlarski e Sérgio Reze (bateria), Théo da Cuíca e Jorge Neguinho (cuíca), Siba (rabeca), Fabio Tagliaferri (viola) e Swami Jr (violão).

Tendo como filtro a sensibilidade, Luísa recorta pedaços da história musical brasileira, da cenografia da cidade, do cotidiano de seu povo e se deixa levar por referências múltiplas. Juntando os retalhos, salta aos ouvidos uma unidade, uma massa sonora de delicadezas, sensualidade e autenticidade. Um exemplo da constante evolução e reinterpretação da música brasileira, a estréia de Luísa Maita exibe uma artista exposta à tradição e modernidade, enraizada à vida contemporânea, pronta para devolver tudo aquilo que absorveu da cidade e das pessoas: a música.

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