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terça-feira, 27 de março de 2012

[agência pirata] BOLOR ENVERNIZADO: ROGER WATERS EM PORTO ALEGRE



::txt::Alexandre Lucchese::
::phts::Carlos Varela::

Domingo estive no estádio Beira Rio para ver o tão esperado show de Roger Waters, o homem de frente do Pink Floyd durante tantos anos. Não tenho como dizer de outro modo: saí com uma péssima impressão daquilo tudo. Para falar bem a verdade, me senti enganado. A desorganização por parte dos produtores do espetáculo contribuiu para isso; porém, o mais grave foi o espetáculo em si - acabei descobrindo que eu realmente não admiro de Roger Waters.

Vamos começar pelo mais simples: a produtora que trouxe o artista abandonou o público diante do estádio. Havia apenas um posto de informação, permanentemente desocupado e não vi ninguém da produção durante todo o tempo que passei na fila (das 17h às 19h20m). Não havia orientação das filas e o próprio público teve de se organizar para evitar os furões e dar informações aos passantes. Disso resultou um atraso de 40 minutos para que Waters entrasse no palco. No final, os produtores nem se deram o trabalho de abrir os portões de acesso à avenida para o público sair (mais uma vez foram os fãs que tiveram de arcar com o trabalho).

Mas realmente pobre foi o espetáculo. Pobre de espírito, que fique claro, já que riqueza material era um dos maiores atrativos da noite. O show de Roger Waters é uma grande reunião dos mais requintados produtos da sociedade tecnocrata, usados para tentar tecer uma crítica contra ela. Não me venha com o velho argumento de "combater o sistema dentro do sistema" - não vou entrar no mérito se isso é valido ou não, o problema é que o discurso em si é tão fraco que só se sustenta por conta dessa massa de playbacks, telões, projeções e pirotecnia.

O truque de Roger Water para fazer a massa sair de lá satisfeita é tentar reconstruir a inocência da plateia, como se fossem crianças sem a altura e a força dos monstros gigantes e abstratos que dominam, pervertem e sujam este ancestral jardim das delícias no qual habitamos. Ver-se pequeno e frágil diante do espelho é ruim, mas tem a vantagem inquestionável de eximir a audiência de algo incômodo e pertubador: a responsabilidade.



Nessa Disney On Ice em embalagem politicamente engajada, não poderia faltar a emoção barata e o moralismo. O show foi dedicado aos que sofreram com o terrorismo de estado, com direito a projeção de imagens de civis assassinados - não sei não, mas fazer espetáculo da dor alheia é algo que me constrange. Sim, não vamos esquecer que The Wall está longe de ser um projeto filantrópico e é uma máquina de fazer dinheiro - este espetáculo está a serviço de alguém, e eu custo muito a acreditar que seja ao teu ou ao meu serviço.

A essa altura, Roger Waters tem um desafio para completar seu discurso de maneira convincente: como lidar com adultos - seres tão igualmente capazes e responsáveis por esse mundo como os monstros gigantescos representados no show - de maneira a lhes fazer crer que são tão inocentes, menores e incapazes. A solução é simples: vender o sexo com algo perigoso e até mesmo sujo. A mulher sensual é representada como um passaporte para a perdição. Guarde seus instintos numa caixa e pratique o amor com disciplina, é o que está nas entrelinhas. Não é difícil de entender porque Waters nunca aprendeu a cantar direito ou a ser virtuoso em algum instrumento: não foi por falta de talento, e sim por medo de deixar fluir essa enorme libido que há dentro de si, e que seu ex-parceiro de banda, David Gilmour, sabe usar de maneira tão libertadora.

Aliás, quando o David Gilmour vem pra cá?

3 comentários:

Anônimo disse...

Muito interessante o texto! Sou fã incondicional de Roger Waters e do Pink Floyd. Estava acostumado a ler somente textos elogiando a turnê The Wall. Já este texto traz somente críticas. Parabenizo por esta peculiaridade. Recebo o texto com carinho. Gosto muito também de Gilmour (voz e guitarra), porém a musicalidade de Waters é para mim impressionante (vide discos solos, Final Cut e The Wall). Forte abraço e (gostei do texto).

Washington Py disse...

e mais, a análise tem sentido sim, mas não é isso que me valeu naquele momento, não mesmo. percebi também a dificuldade de entrar no local do show, de chegar aos banheiros, pegar uma bebida, de sair (tive que esperar uma hora pra sair do estádio)... mas isso não impediu que minha vontade de voltar aos tempos em que escutava the wall pela primeira vez me fizesse querer reviver aquela ingenuidade também citada no texto. me senti de novo extasiado com a magia do evento, sem me deixar influenciar por cagadas da produção que sequer chegam aos ouvidos do agente do tal pastor roger... prevejo repúdio quanto ao meu texto mas o que importava naquela noite era a magia e não o $, afinal todos pagamos pra entrar, e aqueles que não pagaram não tem do que reclamar, até porque ja fazem parte do sistema que o pastor roger waters mantém dignamente: trabalhando e colhendo frutos de genialidades que ELE criou... quando o gilmour aparecer por aqui irei da mesma forma, só que esperando outras coisas do show e não vou querendo enxergar e pregar que o momento não foi mágico por esse ou aquele motivo. o dia em que a música não exercer sobre mim o fascínio, a viagem, a emoção e todos os sentimentos mais loucos que refletem em mim quando participo de algo deste porte, aí sim, não me verei mais fazendo parte da boiada que encarou aqueles portões... pensei até que o show começava fazendo a gente se sentir prestes a virar guizado como no filme, rsss . deixo aqui o meu abraço a TODOS indistintamente!

Washington Py disse...

agora, se fosse uma partida da copa meus amigos, porto alegre jamais se recuperaria do fiasco!!! isso é inegável!!! meu abraço...

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