txt: Tiago Jucá Oliveira
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Para quem mora aqui no cu do país, na província que costuma ficar fora de rota das melhors turnês nacionais, o negócio é mesmo assistir espetáculo pela televisão. A TV Globo exibiu na madrugada do sábado pro domingo um especial em homenagem a Noel Rosa, e convidou para interpretar os feitiços da vila Orquestra Imperial, Lucas Santanna & Seleção Natural, Maria Rita e Marcos Sacramento.
A grande atração, sem dúvida, era a Orquestra Imperial. Interpretando "Fita Amarela", Nina Becker é a grande dama da noite, pois alucina ouvidos mais desatentos que ainda não conhecem sua rica voz. Nina é uma das melhores cantoras do Brasil, senão for a melhor, e não mede esforços pra entoar os versos de Noel. No habitual rodízio de cantores da Orquestra, o hermano Rodrigo Amarante e Rubinho Jacobina dividem o microfone e mesclam "Pela Primeira Vez/Onde Está a Honestidade", respectivamente. E a filha do maestro, Thalma de Freitas, além de suavizar canções com sua voz tranqüila, traz as manhas de atriz pra dar mais vida para "Não Tem Tradução", que, literalmente, não temos como traduzir o momento mágico à frente duma big band super afinada cantando Noel Rosa.
Muitos artistas odeiam essa história de cultura livre e música liberada para download. A produção da Globo acabou por premiar justamente um dos que pensam ao contrário. O cantor, guitarrista e compositor Lucas Santanna licenciou seu último álbum em Creative Commons, disponível baixar diretamente do próprio site do artista, sem sentimento de culpa ou infrção, inclusive com música "Deixa o Sol Bater" aberta para mixagem (Flu e Gustavo Lenza são um dos que já meteram a mão). Lucas Santanna e a Seleção Natural, banda que o acompanha, não perderam a chance de estar na telinha da Globo. A versão feita para "Com que Roupa" foi a mais ousada que a música já teve até os dias de hoje. Um ska maneiro, puxado e levado, obrigatório numa boa pista de dança.
"Palpite Infeliz" e "Filosofia" foram os outros dois ingredientes de Noel que Lucas colocou pra ferver no seu caldeirão rítmico. Lucas entrou como coadjuvante e saiu como o grande nome do especial. E, implicitamente, avisou: enquanto uns se preocupam tanto com o dinheiro dos direitos autorais e restringem sua obra, ele, só com a aparição na TV ganhou muito mais, além de não cair na mesmice quando o assunto é fazer versão de música.
Os dois pontos baixos da homenagem a Noel intercalaram com os bons. Marcos Sacramento tem uma boa banda, traz o clima do samba boêmio regado a gelo e fumaça, mas sua voz e sua maneira de cantar definitivamente ficam abaixo da pedida. Um tanto empolgado, porém forçando a barra, ele cantou "Pela Décima Vez", "Meu Barracão" e "Dama do Cabaré". Por falar em cabaré, quem de lá parecia ter vindo foi Maria Rita, dentro de um vestidinho roxo "tomara que não suba" (ou "tomara que suba", dependendo do mau gosto de cada um). Falta pra essa mulher mais carisma e mais firmeza. Com o olhar grudado no infinito a frente dela, Maria Rita não herdou nenhuma semente da pimenta do reino de sua mãe. Tentou esboçar um choro emocionado em "Três Apitos", mas não conseguiu pingar sequer uma lágrima. Emprestou, também, a voz para "Conversa de Botequim" (único momento feliz dela), "Feitio de Oração" e "Último Desejo". No final das contas, a impressão que ficou é que Maria Rita deve ter saído de casa cantando "com que roupa, eu vou, pro especial que a Globo me convidou". É rocha?!