#CADÊ MEU CHINELO?

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quarta-feira, 21 de setembro de 2011

[agência pirata] FAVELAS, NOSSOS DOCES FRANKSTEINS



::txt::Rodrigo Fernandes::

Em 1942 o cineasta Orson Welles estava no Brasil quando, convidado por Vinicius de Moraes, foi conhecer aquele lugar exótico e excitante que chamavam de favela. O julgamento do rotundo diretor de Cidadão Kane foi curto e grosso: “Isso é um Frankenstein. Um monstro que vai se voltar contra vocês”. Ao que parece, além de inventar o cinema moderno, Welles também tinha o dom da profecia. Hoje, nem o exército segura mais o monstro.

Infelizmente, a versão do monstro de Frankenstein que se fixou no imaginário pop-popular foi a hollywoodiana: uma besta tatibitate com pilhas Duracell espetadas no pescoço que precisa ser exterminada pelos homens de boa vontade. Tudo errado. No livro de Mary Shelley, a criatura é descrita como um personagem articulado, inteligente, culto. Ora bolas, a analogia é perfeita. Toda favela é um Frankenstein. Formado por pedaços de cadáveres, o monstro literário causa repulsa e medo. Como a favela, também desconjuntada feita de nacos sociais heterogêneos – barracos, mansões, comércios clandestinos, ONGs, escolas, escolas de samba, salões de beleza, lan-houses, bocas de fumo, projetos sociais, paraísos artificiais e alta tecnologia, tudo ao mesmo tempo agora. Porém, quem conhece essa fera de perto sabe que por suas vielas também transita beleza, cultura e sabedoria.

Frankenstein, o monstro, foi concebido por um cientista que achava ser capaz de controlar tudo, até a vida. Porém, ao conceber a criatura, enoja-se e a abandona à própria sorte. Quem conhece minimamente a história do Rio de Janeiro sabe a quem cabe o papel de cientista louco. Se Frankenstein – ou o moderno prometeu é muito mais um livro sobre a omissão moral de um cientista e menos um conto de horror, o enredo das favelas é o de um Estado historicamente ausente, que até hoje por meio de caveirões, caveirinhas, UPPs, exércitos, choques de ordem e afins, ainda acredita poder ao menos controlar o monstro que criou.

Quando se vê psicólogos e sociólogos subindo os morros para tentar criar pontes de entendimento entre o Estado e os moradores, a semelhança entre ficção e realidade se aprofunda desgraçadamente. No livro, editado em 1818, tudo o que o titã quer é entender porque foi abandonado. Busca o diálogo com seu criador, mas este, sem ouvi-lo, tenta destruí-lo. Sem voz e acuado, o monstro responde na mesma moeda de violência. Segue-se o terror. Não vou ficar aqui arriscando piruetas sociológicas, mas sabemos que assim também é a relação favela-Estado nos morros cariocas. Pouco diálogo, muito sangue.

No fim do livro, o cientista acaba morto na perseguição à criatura, e esta dá cabo da própria vida para não mais representar um perigo para a sociedade. No mundo real, espera-se por um final mais feliz.

Em tempo: me recuso a usar o termo politicamente correto “comunidade”, criado pelo Estado, ao invés de “favela”. Até porque acho que favela, ao menos para mim, guarda um pouco da nostalgia de outros carnavais, bem mais amenos que os de hoje.



Bonus track I: em algumas versões cinematográficas bobocas, o monstro é preso e exibido como atração de circo. Viajo na comparação e quase posso ver os gringos visitando a laje do Michael Jackson, no Santa Marta, ou dando um passeio no teleférico do Complexo do Alemão.

Bonus track II: sou cria do subúrbio do Rio. Morei há pouquíssimos quilômetros de uma favela de respeito. Assisti in loco o nascimento de pelo menos três delas. Noutras, subi para apresentar workshops literários. Mas sempre que alguém me pergunta se o problema das favelas tem solução não sei o que responder, fujo do assunto. Problema? Creio que o primeiro e definitivo passo é enterrar de vez a ideia de que as favelas são um problema, quando de fato elas tem problemas, um montão deles. Agora, se a questão é a violência, então dou meu braço a torcer. Solução? No way. Basta fazer uma continha primária. Hoje são 17 UPPs, quarenta até 2014. Ótimo, perfeito, se no Rio não existissem mais de 600 favelas. Na melhor das hipóteses, seriam 560 favelas ainda sob a influência do tráfico, da milícia e outros malfeitores de ocasião.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

[release] ONDE MORA O SEGREDO



::txt::Patricia Palumbo::

Muito se fala do suíngue da musica negra, mas se diz pouco sobre a sabedoria que vem do índio e do negro dos quais nós brasileiros herdamos o sangue e a cultura. “Quem balança como o mar não tem medo”, canta Arícia Mess em “Onde Mora o Segredo”. Essa cantora e compositora negra, carioca, descendente de índios, celebra a vida e o divino com sua música há mais de 15 anos. Ela nasceu com o ritmo e o pulso, incorporou a influência da música pop e faz qualquer um dançar sem o menor esforço. Mas não pense que basta se jogar na pista para curtir esse disco, prestar atenção nas letras faz parte da viagem.

Para Arícia Mess a arte é uma oferenda, uma forma de amenizar o sofrimento até mesmo de quem já foi. Por isso seu trabalho é dedicado às divindades femininas, às índias e negras que habitaram nosso país continental e que entregaram suas vidas em décadas de escravidão e dor. No batuque dos terreiros se faz a conexão com o divino, na pista a experiência se repete com alegria : “Rainha de Angola mandou dançar”. E todo mundo dança. Não dá pra ficar parado enquanto esse convite nos chama.

Arícia cuidou de cada detalhe dessa produção de qualidade técnica apuradíssima que tem a energia da música feita ao vivo. Por pouco mais de um ano ela testou esse repertório nos palcos e depois da banda quente e afinada gravou as bases com o power trio que a acompanha : Bruno Silveira (bateria), João Paulo Deo Gracias (baixo) e Mauricio Caruso (guitarra). Ela assina a direção artística do CD e todos os arranjos junto com a banda, Carlos Triha e Fernando Morello – esses, parceiros desde o final dos anos 90.

Arícia Mess em começo de carreira foi a sensação dos palcos cariocas com uma banda de 9 pessoas e essa mistura de música pop com tropicalismo baiano. O Brasil estava carente de originalidade e de balanço. Seu primeiro disco saiu em 2000 numa época em que ser independente não era nada comum. Ela foi uma das primeiras artistas a misturar sem medo o Tropicalismo (no caso de Arícia especialmente Gilberto Gil) com Michael Jackson e Stevie Wonder. Hoje a diversidade é o mote na expressão cultural no Brasil e ser independente é a principal saída.

Vinicius de Moraes já dizia que o samba é uma forma de oração. Aqui tudo celebra a vida com a sabedoria de quem sabe esperar a hora boa e seguir a correnteza. É só prestar atenção pra fazer a coisa certa, que nesse caso é ouvir “Onde Mora o Segredo” bem alto e se deixar contaminar pela força e pela felicidade que nos traz a música de Arícia Mess.

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

SAMBA É ROCK (E VICE-VERSA)



::txt::Fagner Marques::

Como tudo que é relevante, surgiu por acaso, no improviso, na imaginação. Era 2007, acho. Tinha 24 anos e uma fixação: me especializar em algo. Achava muitos assuntos interessantes, desde física quântica até a importância da geladeira para os esquimós. Mas nada me era tão fascinante quanto o rock.

Mais que um estilo musical aquilo era, para mim, uma filosofia de vida. A representação da luta social sem armas. Ou melhor, com OUTRAS armas. "Essa máquina mata fascistas", cravara Woody Guthrie - um dos principais ícones da música country e de protesto do século passado e grande influência para o rock 'n roll - no case de seu violão.

De outro lado, esta forma de ver o mundo - e a vida, por consequência -, ganhou contornos populares. Era a bela dualidade: contestação e popularidade. O resto todo mundo já conhece. A essência blueseira na década de 1950, os movimentos sociais, a revolução sexual, Serguei (e meio mundo) comendo Janis Joplin, Hendrix queimando sua guitarra e tocando o horror, os Beatles exorcizando os fãs com doses cavalares de psicodelia, e o mundo que seguiu adiante e se tornou o que é hoje. Não importa! No fim, tudo é lindo, incoerente e polemico. Como uma declaração de Caetano.

Foi exatamente neste momento que a pulga se escondeu atrás da minha orelha. Pensei: onde, pelos infernos, estava o Brasil, enquanto o resto do mundo explodia em hormônios e exaltações rebeldes? Aquilo era sem sentido. Minha epifânia vinha de algo que ocorrera há dezenas de milhares de quilômetros de casa. Totalmente deslocado do meu cotidiano.

"Mentiroso", "Judas", podem exclamar alguns, acreditando que me rebelei contra o que sempre acreditei. Muito pelo contrário. Tentava descobrir como meu país, meu povo, havia contribuído com isso tudo. Até que um dia cheguei no samba.

Nossa matriz musical foi, para o Brasil, tudo o que o rock foi para Estados Unidos e Reino Unido. Quiçá, até mais! O batuque, tomado emprestado dos escravos, se modernizou na década de 1930. Se transformou na representação máxima do modo de vida da capital brasileira na época - o Rio de Janeiro -, retratando o cotidiano das classes, seus embates e os problemas estruturais de uma sociedade que engatinhava para se organizar. Mais do que isso, o samba questionava, na essência, os desfavores e os protestos sociais no Brasil.

Se Chico Buarque, Os Mutantes, Gal Costa, Maria Bethânia, Toquinho, Vinícius de Moraes e tantos outros nomes da chamada MPB são considerados, hoje, porta-vozes que reclamaram as ilegalidades e injustiças da ditadura militar, muito da produção deles se deve aos sambistas. Tanto os bambas das periferias e dos morros quanto os músicos e os poetas de classes mais favorecidas. Foram eles que, décadas antes, abraçaram a mesma causa: apresentar - em forma de versos e acordes - a vida, as angústias, as alegrias, as esperanças e as injustiças do povo. O samba foi o início do NOSSO movimento de contracultura.

Não encare este escrito como uma tentativa de comparar dois estilos musicais. Talvez queira, aqui, apenas apresentar o 'achismo' de quem vê a cultura brasileira como algo a ser preservado a admirado. Ok, admito, comparo sim. Dois estilos de vida, duas formas de ver o mundo. Diferentes em vários planos, mas muito parecidos na essência. Para mim, samba é rock. E vice-versa!

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