:: txt :: Thiago Paulino::
Animação brasileira e segundo longa-metragem de Alê Abreu, "O Menino e O Mundo" reúne realidade e magia em traços simples.
O mundo pelo olhar de um menino. A frase é simples, mas o significado pode ser profundo. Coisas simples também podem ser geniais e dizer muito. Simplicidade de uma boa música: como Three Little Birds (Bob Marley) ou em um poema Haikai japonês no qual em apenas três linhas conectam-se harmonicamente idéias passando recados,às vezes belos e profundos. Simplicidade está na história de "O Menino e Mundo"(2003), segundo longa metragem do paulistano Alê Abreu. Simplicidade de traços, simplicidade na narrativa. Mas não por isso menos genial e belo.Pouquíssimos diálogos com um dialeto próprio de um mundo mágico (mas ao mesmo tempo tão próximo a realidade). Diálogos poucos e guturais. Seja na conversa da mãe com o pai do menino, ou até mesmo na voz impostada de uma dupla de apresentadores do telejornal. Os diálogos não tem legenda, mas entendemos tudo.
Mas que Mundo é esse?Um mundo em que o menino sai em disparada atrás de um pai que partiu em busca de um trabalho. Um mundo com cores de um bailado de rua com músicas que alimentam esperança. Mas também um mundo cruel, de cores escuras, mundo do consumo, mundo onde se vive longe de onde se trabalha. Isso tudo está lá na simples corrida de uma vila até uma cidade grande. Em um mundo que cabem muitos mundos. Durante 80 minutos o menino que sai correndo em busca do pai, passa por muitos lugares e (re)conhece outros personagens. Nessa jornada entendi dois recados do menino: 1) o nossa maior jornada sempre está ligada ao crescimento de nós mesmos. 2) A arte tem uma força incrível de reforçar utopias cultivar esperanças tão essenciais em um "admirável mundo moderno". Mundo moderno que falhou e ainda falha em vários aspectos da boa humanidade que há em nós. Como um bom Haikai, "O Menino e O Mundo" fecha seu ciclo de forma simples e harmônica. E por falar em harmonia... a trilha fez um feliz casamento do filme. Seja na poesia de Emicida que nos dá uma instigada para sair o cinema pensando no mundo quando os créditos finais sobem; Ou nas melodias instrumentais que funcionam como uma "espinha dorsal" da narrativa. A música reforça encontros, emoções e a memória do menino como no momento em que escuta a flauta de pífano do pai.
Nem tanto pela estética, mas pelo conteúdo, a animação de Alê Abreu me remeteu a outra obra: “L’homme qui plantait des arbres” (O homem que plantava árvores, de 1987), dirigido por Fréderic Back. A produção, se não me engano franco-canadense, é baseada em um conto do romancista francês Jean Giono, de 1953 e também traz dois mundos só que sob ótica de um velho pastor que se dedicava a plantar carvalhos. O filme também mexe com cores e esperanças. "O Homem que planta árvores" ganhou vários prêmios: Oscar (1988), Annecy (um dos mais tradicionais festivais de animação do mundo que existe há 45 anos), (1987), Festival Internacional de Ottawa (1988). Apesar de lançado em 2014 "O Menino e o Mundo" Alê Abreu também já coleciona prêmios em Cuba, Otawa, Mostra Internacional de São Paulo. Uma coisa é certa: o maior prêmio para uma animação desse porte é sua maior circulação, portanto se estiver passando na sua cidade vale conferir."O Menino e O Mundo" - é uma boa metáfora do mundo real, do mundo que queremos e do mundo que ainda não nos libertamos. Vem a calhar numa época de efervescência o Brasil atravessa, ou que, de certa forma, em vários países de nosso mesmo mundo atravessam.
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