#CADÊ MEU CHINELO?
segunda-feira, 25 de junho de 2012
[agência pirata] FUI À RIO+20 E TUDO QUE GANHEI FOI ESTE APITO
::txt::André Barcinski::
“Ê ê ê ê ê… Índio quer apito, se não der, pau vai comer.”
Nenhuma frase resume tão bem o Brasil. Mais de 512 anos depois de Cabral pintar por aqui, o Brasilzão continua dando apito para índio. E os índios, claro, somos nós.
Nada aqui é feito para resolver. É tudo cosmética. “Tudo perfumaria”, como diz um amigo.
Este país só funciona quando tem alguém de fora olhando. E a Rio +20 foi mais uma prova.
O trânsito está péssimo? Fácil: suspendam-se as aulas.
O Edward Norton não consegue chegar do hotel à praia do Leblon? É só dar folga para o funcionalismo público.
Aqui perto de casa, o posto da Polícia Rodoviária em Mambucaba (RJ), fechado há dois anos por falta de efetivo, foi reaberto – mas só para a Rio+20. Depois que a Hillary for embora, fecha de novo. E os bananas dos moradores que se danem.
Um amigo, velejador, navega com a família há anos pela costa do Rio de Janeiro e raramente vê um barco da Marinha patrulhando os mares. Durante a Rio+20, seu veleiro foi parado QUATRO VEZES em dois dias, incluindo uma inspeção com direito a oficiais armados entrando na embarcação.
Dá para levar a sério uma conferência que teve palestra de Luciano Huck, multado pela Justiça por crime ambiental, ao cercar uma praia com bóias para impedir a entrada de “indesejáveis”?
“Ah, mas o que importa na Rio+20 é o documento final”, dirão alguns.
Discordo. Não interessa o documento. Porque o Brasil não vai cumprir nada. Não existe vontade política de fiscalizar nada. É só blablabá. Só perfumaria.
Veja só: uma conhecida, que trabalhou na montagem do stand de um órgão público na Rio+20, disse que o custo do stand, cujo objetivo era “divulgar as ações sociais e sustentáveis” do tal órgão, equivale a três vezes o orçamento anual de uma APA (Área de Preservação Ambiental) daqui da região, que protege uma área de 33 mil hectares.
Esta APA não tem verba, não tem apoio, não tem nada. Uma de suas funções é fiscalizar obras irregulares na costa, mas nem barco ela tem. Só falta o governo mandar os fiscais saírem a nado por aí.
Curiosamente, alguns dos muitos crimes ambientais na costeira – e que deveriam ser fiscalizados por esta APA – são cometidos por bilionários que construíram mansões em áreas de preservação. E alguns destes ricaços estavam na Rio+20, divulgando suas ações em prol da natureza e da humanidade. Não é lindo?
Dá para acreditar em sustentabilidade num país que diminui o IPI de carros para satisfazer às montadoras, enquanto sucateia o transporte coletivo?
Já me conformei. Não acredito em mais nada. Quando alguém vier falar em sustentabilidade, vou soprar meu apito até que o chato vá embora.
sexta-feira, 22 de junho de 2012
[domínio público] EPIGRAMA
::txt::Gregório de Mattos::
Que falta nesta cidade?... Verdade.
Que mais por sua desonra?... Honra.
Falta mais que se lhe ponha?... Vergonha.
O demo a viver se exponha,
Por mais que a fama a exalta,
Numa cidade onde falta
Verdade, honra, vergonha.
Quem a pôs neste rocrócio?... Negócio.
Quem causa tal perdição?... Ambição.
E no meio desta loucura?... Usura.
Notável desaventura
De um povo néscio e sandeu,
Que não sabe que perdeu
Negócio, ambição, usura.
Quais são seus doces objetos?... Pretos.
Tem outros bens mais maciços?... Mestiços.
Quais destes lhe são mais gratos?... Mulatos.
Dou ao Demo os insensatos,
Dou ao Demo o povo asnal,
Que estima por cabedal,
Pretos, mestiços, mulatos.
Quem faz os círios mesquinhos?... Meirinhos.
Quem faz as farinhas tardas?... Guardas.
Quem as tem nos aposentos?... Sargentos.
Os círios lá vem aos centos,
E a terra fica esfaimando,
Porque os vão atravessando
Meirinhos, guardas, sargentos.
E que justiça a resguarda?... Bastarda.
É grátis distribuída?... Vendida.
Que tem, que a todos assusta?... Injusta.
Valha-nos Deus, o que custa
O que El-Rei nos dá de graça.
Que anda a Justiça na praça
Bastarda, vendida, injusta.
Que vai pela clerezia?... Simonia.
E pelos membros da Igreja?... Inveja.
Cuidei que mais se lhe punha?... Unha
Sazonada caramunha,
Enfim, que na Santa Sé
O que mais se pratica é
Simonia, inveja e unha.
E nos frades há manqueiras?... Freiras.
Em que ocupam os serões?... Sermões.
Não se ocupam em disputas?... Putas.
Com palavras dissolutas
Me concluo na verdade,
Que as lidas todas de um frade
São freiras, sermões e putas.
O açúcar já acabou?... Baixou.
E o dinheiro se extinguiu?... Subiu.
Logo já convalesceu?... Morreu.
À Bahia aconteceu
O que a um doente acontece:
Cai na cama, e o mal cresce,
Baixou, subiu, morreu.
A Câmara não acode?... Não pode.
Pois não tem todo o poder?... Não quer.
É que o Governo a convence?... Não vence.
Quem haverá que tal pense,
Que uma câmara tão nobre,
Por ver-se mísera e pobre,
Não pode, não quer, não vence.
sábado, 16 de junho de 2012
[...] DISFARCE
::psy::Júlio Freitas::
Hoje encontrei um poema não falava de amor e fedia a esgoto não rimava com dor mas sim, com biscoito. Acabei de encontrá-lo no ralo do banheiro era feio e sujo e escarrava o tempo inteiro. Ninguém o leu. Ninguém o quis. Pensei num disfarce. Então lavei-o, passei perfume botei pomada pra que a bunda não lhe assasse guardei numa caixa bem bonita e só assim eu consegui que o publicassem.
domingo, 3 de junho de 2012
[rango] MOCOTÓ DO BRASIL
::txt n phts::Diogo::
Um dos lugares que mais ouvimos falar nos últimos tempos, e que foi citado em absolutamente TO-DAS as aulas das duas edições do Food Experience, é o Mocotó. Lembro bem do Riq Freire escrever maravilhas sobre ele, tempos atrás.
Todo mundo sabe da história de vida do Rodrigo Oliveira. Se você não sabe, está no mínimo uns 3 anos atrasado. Trocando em miúdos, tempos atrás ele bateu de frente com o velho dele, o seu Zé de Almeida, assim que decidiu largar a faculdade de engenharia ambiental e estudar gastronomia. Logo depois de uma viagem do seu Zé ao sertão pernambucano (lar-doce-lar da família), o Rodrigo deu um tapa na peruca do Mocotó, estruturou/profissionalizou a parada, mas mantendo a mesma cara de butecão.
E todo mundo sabe também (inclusive virou lenda) da pronta e imediata torcida de nariz que o seu Zé deu, e que até hoje não engole direito essa repaginada, especialmente as releituras que o Rodrigo faz em cima de receitas consagradas da cozinha nordestina.
Mas como tudo tem sempre um final feliz, o Rodrigo foi levando o Mocotó nestes novos moldes à contra-gosto do velho, e hoje já faz girar mais de 20 mil pessoas por mês no buteco, sem jamais deixar de atender o mesmo público de sempre (taxistas, pedreiros, motoboys, imigrantes em busca de um futuro com ar-condicionado e direção hidráulica, domésticas e demais moradores da Vila Medeiros), além de uma nova turma que aprecia a haute cuisine nordestina. O mais límpido e cristalino exemplo de hi-low gastronômico.
Score! A Vila Medeiros havia virado um dos pontos centrais da gastronomia paulistana, que vamos combinar, é uma das capitais com o menu mais extenso e rico do mundo. Chora Itaim! Chora Jardins! Chora Vila Nova Conceição! Chora Higienópolis! Vem pra Vila Medeiros você também.
Finalmente, depois de muito sonhar com esse lugar, me vi no meio de um evento em Sampa rodeado de gente que compartilhava do mesmo sentimento que eu com relação ao Mocotó: Bete Duarte, Zelda e Floriano Spiess. Formou a barca rumo a Vila Medeiros pra conhecer Mocotó-pai e Mocotó-filho
Mesa comunitária, como mandam as regras de etiqueta dos restaurantes mais modernos e descolados. Agora, cumé que esse desprendimento dá certo em plena Vila Medeiros? Vamos falar mais sobre isso ao sabor de torresmos em duas versões. A primeira delas: de barriga.
A segunda versão do torresmo veio numa textura, digamos, crocante. Fica tranquilo que estamos apenas começando. Dá tempo de filosofar bastante sobre o avanço do Mocotó rumo ao primeiro lugar no coração dos principais foodies mundo afora.
Em seguida veio o que pra mim foi uma das grandes surpresas dos últimos tempos: Mocofava, a mais perfeita, suprema e absoluta combinação de mocotó com favada. E olha que até pouco tempo eu nem sequer podia sentir o cheiro de mocotó.
Relaxa, ainda estamos na parte das entradinhas. Tem bastante tempo pra assuntar e enrolar até o final da experiência. Agora foi a vez da porção de dadinhos de tapioca com queijo-de-coalho e molho de pimenta agridoce. Vou evitar os elogios em cima de cada prato na medida em que meu repertório já se foi faz mais ou menos uns nove parágrafos.
Clássico é clássico, e vice-versa: bolinhos de carne-seca. Calibra na pimenta e sijoga, meu garoto!
Iniciando os principais, o Atolado de Bode, que pro Floriano e pra Bete foi o campeão da noite:cabrito guisado ensopado à moda sertaneja, dourado no forno e servido com mandioca, cebolinha e coentro. No comments.
A segunda cartada de mestre do Rodrigo ainda “no que tange” os pratos principais foi um sou-simples-mas-sou-limpinho Baião de Dois. Tá, vamos combinar que foi o menos tchãns da noite, mas meio que escorreu uma lagriminha agora aqui no canto do olho direito ao lembrar dele.
Fechando com chave de ouro a série, carne-de-sol preparada artesanalmente e servida com manteiga-de-garrafa, alho assado e pimenta biquinho. Taqueospariu… E despejar uma farinha de mandioca pra misturar com o molho, na finaleira? Aprende comigo enquanto to aqui!
O que é que a gente vai dizer sobre um lugar que tem “tubaína” junto às opções de bebidas no cardápio? Cara, me dá um abraço apertado e me jura que não é sonho!
Tem coisas que a gente não sabe muito o porquê. Se a gente perceber, o Mocotó pratica o anti-marketing… é longe bagarai, nada convencional, num lugar chamado Vila Medeiros e que pelo nome já pode afugentar marinheiros de primeira viagem, frequentado em grande parte por pessoas que certamente seu pai não aceitaria bem para seu namorado, num clima muito beira de estrada da periferia de Tihuana, sem xexexê nenhum e todo trabalhado na simplicidade. Mesmo assim, virou hit!
Tá, sobremesa porque a gente tem que voltar lá pra São Paulo ainda. Primeiro (segura na cadeira aí e prepara o babador) um brulée de doce de leite.
Segundo, um brownie com cupuaçu. Alô cupuaçu, a tua rima é cretina e eu nem mesmo sei direito quem és, do que te alimentas, onde moras e de que família vens… mas ó, delicia pura viu?!
Sorvete, mesmo sendo sorvete, aparentando sorvete e trajando roupa de sorvete, pode ser muito mais do que sorvete. Entende? O sorvete de RAPADURA do Mocotó taí pra provar essa teoria! #choradiegofabris
Agora, gran finale mesmo foi o mestre Rodrigo Oliveira, na capa da gaita depois de bater perna e braço na cozinha até altas horas da noite, vir sentar conosco e falar que já lavou tanto prato nessa vida que, empilhados, encostariam na lua FÁCIL. E que o seu Zé de Almeida nem anda mais tão contrariado assim… ufa, a clientela agradece e brinda com uma bela talagada de cachaça. Sou bobo de negar um brinde desses?
To conferindo aqui a conta e meio que não acreditei. Fiz um check-list vendo se batia mesmo, se os caras não tinham esquecido de nada…: 65 reais por pessoa. “A receita pra manter uma casa por tanto tempo tem dois ingredientes: boa comida e hospitalidade. Mesmo parecendo simples, é algo que só se consegue com muita dedicação, talento e acima de tudo, paixão”, diz o Rodrigo. Tá explicado!
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