:: txt :: Valter F. Santos ::
Havia uma casa abandonada que sempre me chamou bastante atenção. Era cercada por uma grade verde e rodeada de mato. Ela tinha as paredes brancas com janelas e portas da mesma cor do gradeado. Curiosamente, nunca teve uma viva alma que a habitasse por muito tempo.
Quando eu era pequeno e passava por ela, delirava imaginando mil coisas que poderiam acontecer de dia e de noite naquele lugar. Era divertido. Certa vez, imaginei cobras, macacos e zebras tocando violino sob a regência de um caboclo da mata, que assumia a função de maestro. Loucura total. E naquela época nem ocorria na minha cabeça que um dia eu beberia cafés, fumaria cigarros e tomaria algumas garrafas de cerveja enquanto uma música seria executada no jukebox do boteco da esquina. Bons tempos. A vida parecia não ter fim. O passar dos dias eram mais vagarosos; os dias de sol eram mais felizes; as festas em família eram mais animadas, com toda aquela gente correndo, pulando e gargalhando de um lado para o outro; o estouro do champagne era mais seco e barulhento; o som do choque das garrafas era mais límpido e estridente; e o disco do Senegal e do Carlos Barbosa pareciam-me mais lúdicos. Naquela época a vida era outra. Boa fase. Boa fase, mas que, aqui, não voltará mais - em virtude do “bolachão” do Senegal e do Carlos Barbosa, lógico. Mentira.
O tempo passou e tudo mudou. Ao mesmo passo em que a areia da ampulheta se esvai para o polo negativo, a corda se estica e, por conseguinte, fica mais suscetível ao seu ponto de rebentamento.
A casa foi demolida. Construíram um estacionamento em cima do terreno. Os dias estão voando em velocidades quase que imperceptíveis à mente humana. Os dias de sol não são mais tão agradáveis como eram; porque a camada de ozônio já está mais arregaçada que buceta de puta em época de pagamento de décimo terceiro. Hoje, as festas em família já não possuem o mesmo brilho, tal como àquele que era presente no olhar de todos os membros que um dia as constituíram. Não tenho mais forças para abrir o champagne nem um sistema auditivo apto a escutar aquele velho barulho de que não mais me recordo.
O tempo levou tudo. Só me restaram vagas impressões do que um dia existiu e que daqui um pouco não vou mais lembrar.
Assim é a vida. Assim é o tempo. Isso é existir.
#CADÊ MEU CHINELO?
Assinar:
Postar comentários (Atom)
#ALGUNS DIREITOS RESERVADOS
blog O DILÚVIO by
O DILÚVIO is licensed under a
Creative Commons Atribuição-Compartilhamento pela mesma Licença 3.0 Brasil License.
Você pode:
- Compartilhar — copiar, distribuir e transmitir a obra.
- Remixar — criar obras derivadas.
Sob as seguintes condições:
-
Atribuição — Você deve creditar a obra da forma especificada pelo autor ou licenciante (mas não de maneira que sugira que estes concedem qualquer aval a você ou ao seu uso da obra).
-
Compartilhamento pela mesma licença — Se você alterar, transformar ou criar em cima desta obra, você poderá distribuir a obra resultante apenas sob a mesma licença, ou sob licença similar ou compatível.
Ficando claro que:
- Renúncia — Qualquer das condições acima pode ser renunciada se você obtiver permissão do titular dos direitos autorais.
- Domínio Público — Onde a obra ou qualquer de seus elementos estiver em domínio público sob o direito aplicável, esta condição não é, de maneira alguma, afetada pela licença.
- Outros Direitos — Os seguintes direitos não são, de maneira alguma, afetados pela licença:
- Limitações e exceções aos direitos autorais ou quaisquer usos livres aplicáveis;
- Os direitos morais do autor;
- Direitos que outras pessoas podem ter sobre a obra ou sobre a utilização da obra, tais como direitos de imagem ou privacidade.
- Aviso — Para qualquer reutilização ou distribuição, você deve deixar claro a terceiros os termos da licença a que se encontra submetida esta obra. A melhor maneira de fazer isso é com um link para esta página.
Nenhum comentário:
Postar um comentário