::txt::Charles de Gaulle::
Andei lendo sobre o conflito entre os estudantes da USP e a Polícia Militar e cheguei à conclusão de que eu não tenho sorte mesmo. Quando enfrentei a crise de maio de 68, não tive a opinião pública do meu lado. Depois que os estudantes ocuparam a Faculdade de Nanterre, nos arredores de Paris, para protestar contra a sociedade de consumo e o ensino tradicional, fiz uso da força e tornei-me, logo eu, impopular.
A tentativa de sufocar aquele arroubo juvenil tomou grandes proporções. Nos dias seguintes, o conflito estendeu-se a outros setores. Mais de 10 milhões de trabalhadores entraram em greve. Os protestos tomaram conta do país, novos conflitos e enfrentamentos com a polícia pipocaram por toda parte. As instituições tremeram, por um triz não entramos em guerra civil. Cheguei a ponto de declarar a situação incontrolável e propor um referendo. As ruas estavam tão barulhentas que ninguém escutou. Não me restou alternativa senão dissolver a Assembleia e convocar eleições legislativas para junho. Meu partido venceu o pleito, mas no ano seguinte amarguei uma derrota no referendo sobre a regionalização e reforma do Senado. Fiquei désolé, pedi demissão e retirei-me da política. Foi uma saída melancólica para uma carreira triunfante.
A minha falta de sorte fica mais evidente quando se compara às verbalizações do pensamento de cada período. Aliás, as barricadas de Paris foram pródigas em slogans libertários. Maus tempos aqueles em que não havia redes sociais para chamar os protestantes de baderneiros mimados.
Outra diferença entre maio de 68 em Paris e outubro de 2011 na USP é que as frases de protesto antes eram gritadas e pixadas pelos estudantes. Agora elas vêm da sociedade e da imprensa. Ontem, palavras de ordem. Hoje, palavras por ordem. Acompanhe só:
Maio 68
"É proibido proibir"
USP 11
"É proibido"
Maio 68
"Sejam realistas, exijam o impossível!"
USP 11
"Sejam realistas”
Maio 68
"A imaginação ao poder"
USP 11
"A imaginação? Ah, vai se f..."
Maio 68
"O patrão precisa de ti, tu não precisas dele"
USP 11
“O patrão precisa de ti amanhã bem cedo”
Maio 68
"Revolução, eu te amo"
USP 11
“Revolução, eu conheci outra pessoa”
Maio 68
"Abaixo a universidade"
USP 11
“Me abaixo pra universidade”
Maio 68
"O sonho é realidade"
USP 11
“O sonho, em realidade, é sonho”
Maio 68
"O sagrado, eis o inimigo"
USP 11
“Consagrado, eis o nosso amigo”
Maio 68
“Nós somos todos judeo-alemães"
USP 11
“Nós somos todos alemães"
Maio 68
"Acabareis todos por morrer de conforto"
USP 11
“Acabareis todos por morrer de conforto. Deus te ouça”
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