::txt::Karl Marx::
Eu não sei se vocês leram que um sujeito chamado Alexandre Kluge fez a adaptação de O Capital para o cinema. Seu filme tem quase dez horas de duração. Claro que você quer saber a minha opinião sobre a película. Eu digo. Não vi e não gostei. Tenho cá minhas razões. E se lhe parecer contraditório, lembre que sou dialético.
A publicação de O Capital animou revoluções pelo mundo afora. Mas foram poucos os que passaram das primeiras páginas do primeiro livro que compõe a obra. Muitos defenderam as ideias contidas ali com a própria vida, tendo lido somente a orelha. Achei que uma adaptação cinematográfica pudesse, enfim, reverter esse fato. E que sua exibição iria conscientizar as grandes massas de trabalhadores explorados, que pagam por um saco de pipoca e um balde de refrigerante mais do que pelo ingresso. Mas, pelo amor do ópio do povo, quem vai se interessar em ver um documentário de nove horas e meia, em tempos de Twitter?
Entendo que o cineasta se aventurou em um empreendimento difícil. Ele próprio confessou isso em entrevistas ao dizer que fazer um filme sobre O Capital é o mesmo que filmar a lista telefônica, com o agravante de que a última ainda permite certo tipo de representação que o meu ensaio econômico-filosófico não suporta. Depois dessa comparação, resolvi nem conferir o resultado. Lista telefônica é um negócio anacrônico. Nem lembro mais a última vez que vi uma. Diferente da minha concepção dialética da história que a cada crise do sistema financeiro global ganha novo vigor.
Para piorar, o filme se chama Notícias de Antiguidades Ideológicas. Só consigo ver outros dois títulos de filme que conseguem igualmente, na sua sinceridade, manter a plateia afastada: Evita e Cilada. Contam-me que no Brasil a projeção teve intervalos para almoço, lanche e jantar. É o que se pode chamar de versão 3D. Uma dormidinha depois de cada refeição. Aliás, para quem gosta de roncar no cinema, o filme de Kruge é um prato cheio. Dura uma noite inteira.
Engels argumentou que a lógica da indústria do entretenimento é a criação de produtos rápidos e de fácil consumo. E que um longuíssima-metragem como esse, com depoimento do ensaísta Hans Magnus Enzensberger, do filósofo Peter Sloterdijk e do cineasta franco-suíço Jean-Luc Godard, é uma maneira de se contrapor a esse formato que anestesia as plateias. Discordei completamente. Quero que a classe operária chegue ao paraíso sem passar pelo purgatório. Só não disse nada porque foi Engels quem financiou O Capital. É preciso manter uma boa relação com os investidores.
O mundo anda muito impaciente e solicitado. O camarada que desejar popularizar os conceitos contidos em O Capital tem de tentar, minimamente, seduzir o proletariado. As armas capitalistas são poderosas. Se queremos transformar a sociedade temos de encarar a concorrência com os Transformers.
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