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segunda-feira, 5 de outubro de 2009

MUSIC RULES

# agência pirata #
Música Digital e Direito Autoral

txt: Eric Harvey
tradução: coletiva


Numa época em que tudo o que se relaciona às instituições, rituais e valores da música popular se encontra num estado de fluxo sem precedentes em virtude de mp3s, qualquer preço é justo pela música digital, certo? A Apple de certa forma emergiu como um determinador de preço – antes U$ 0,99, agora US$ 1,29 – para singles digitais adquiridos legalmente; mas cortes federais tomaram para si a atribuição de fixar o valor de mercadorias ilegalmente obtidas. Que tal U$ 22.500 por cada mp3 ? Tal foi o montante a que Joel Tenenbaum – um graduando da Boston University – foi condenado a pagar por um juri por cada download admitido durante seu julgamento recentemente concluído. No início deste ano, a sentença aplicada a Jamie Thomas-Rasset, uma mãe de Minesota, foi ainda mais ridícula: US$ 1,92 milhões por 23 músicas, perfazendo US$ 80.000 por música. De tão ilógicos, tais números, determinados por raciocínios tão arcaicos, são surrealistas. Trata-se de um satânico domínio do absurdo, comparável ao senador Iselin colhendo de uma garrafa de ketchup o número de comunistas no congresso em Sob o domínio do mal. Talvez o mais assustador seja que advogados tenham se tornado, neste quadro, a mais lucrativa categoria de intermediários musicais a emergir nesta década.

Após nove anos e cerca de 20.000 processos movidos pela RIAA depois do primeiro caso contra o Napster em 2000, os julgamentos de Tenenbaum e Thomas-Rasset claramente complementam o quadro do direito relativo ao mp3 nesta década. Face às abundantes evidências de que processar ouvintes não resulta em nada salvo rechear seus cofres e pagar seus advogados, grandes gravadoras recusam-se a abandonar seu propósito de intimidar quem baixa. Trata-se de uma estratégia estúpida, da qual julgo estarem cientes, mas ao menos eles estão reconhecendo um dos pressupostos básicos da lógica legal. Do mesmo modo como a tecnologia é uma força social criada por humanos com poder para expandir ou restringir o que somos capazes de fazer, tal se dá com o direito. Se a lei dos direitos autorais pudesse nos convencer de que música, uma das mais inerentementemente colaborativas formas de expressão, deva ser regulada por um estatuto baseado no ideal romântico do autor solitário; e que um desses indivíduos sozinhos possa de fato ser o Universal Music Group, no que mais poderia nos fazer crer?

Na verdade, em muitas coisas. Especialmente quanto a como nos conhecemos em relação à música. A propriedade intelectual tem se expandido rapidamente por todos os cantos de nossa vida diária durante as últimas décadas, dando dois grandes passos até chegar à situação atual. Primeiro, a indústria do entretenimento percebeu, sob Ronald Reagan, que suas commodities culturais, se pudessem ser protegidas contra redes piratas estrangeiras, poderiam ser uma imensa fonte de lucro para os EUA no nascente mercado global. Segundo, Bill Clinton e Al Gore reconheceram, no início dos anos 90, que a “supervia da informação” era de fato um mercado vasto e superpopuloso, deixando a midia corporativa e seus advogados esboçarem a mais radical revisão do direito autoral desde que sua versão britânica foi adotada em 1790. O Digital Millenium Copyright Act, aprovado em 1998, redefiniu o ato de copiar uma música ou álbum como equivalente, mais ou menos, a ouvi-lo(a) – se baseando no fato tecnológico de que quando alguém clica duas vezes em um mp3 no iTunes, tecnicamente duplica a música na memória RAM de seu computador por toda sua extensão. Logo, cada vez que você ouve uma música em seu computador, está, de acordo com o DMCA, violando a lei dos direitos autorais.

Então, há o “não tão querido” defunto DRM. O DMCA permitiu aos proprietários de direitos autorais embutir o código em cada mp3, restringindo determinadas formas de ouvir antes mesmo que o consumidor legal pudesse pensar sobre elas. Ele também tornou ilegal remover essas restrições. O “equilíbrio” determinado constitucionalmente entre a proteção de direitos autorais e o uso justo, em outras palavras, já não estava a ser decidido por argumentos judiciais bagunçados, mas imposta pelo código digital criado por empresas de tecnologia. Esses inofensivo agregados de zeros e uns, iconicamente representando o trabalho criativo de muitas pessoas, estava te encarando de volta, com o pleno conhecimento de que você estava prestes a fazer algo ilegal. Como tais, elas se limitavam (porcamente no entanto) a cinco outros computadores, tendo como resultado a imposição de restrições artificiais aos rituais sociais que tinham permitido à música sobreviver e circular por milênios.

O que o DRM nos ensinou durante a sua vida curta é que para a lei funcionar as pessoas têm de acreditar nela. Isso não precisa de um desvio contracultural no nível do Pirate Bay, mas a simples idéia de que as regras estabelecidas são baseadas em bom senso e não na lógica fria de balanços corporativos. Os selos e os seus sócios lobistas da RIAA não são estúpidos, eles estão apenas desesperados. Eles sabem que quando as coisas não são lógicas, a forma mais inteligente de levar as pessoas a assinar embaixo é começar jovem e misturar a retórica da educação com uma porção razoável de alarmismo passivo-agressivo. Eu lhes ofereço “Music Rules“, um conjunto de material impresso para professores, que certamente não precisam de mais arcabouços externamente sancionados lhes dizendo como ensinar, muito menos de um que recorra a uma pedagogia construída para criar submissão irrefletida a uma lei ilógica. Aqui está um trecho real – isso não é uma piada – que recorre ao alarmismo da Guerra-Fria e a um termo novo, estrategicamente escolhido (songlifting, “furto de canções”) pelo seu efeito retórico:

Agora, descubra se o furto de canções é um problema real em sua comunidade. Use esta tabela para entrevistar membros da família e amigos sobre onde eles obtêm música. Traga os seus resultados de volta pra classe e compare-os com os de seus colegas. Use seus dados para descobrir quanto o furto de canções ocorre entre as pessoas que você conhece. Veja por si mesmo, completando o cálculo abaixo.

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